O FIO DAS MISSANGAS - Mia Couto (resenha de livro)

O FIO DAS MISSANGAS - contos

Mia Couto

São Paulo: Companhia das Letras, 2004 – terceira reimpressão – 147 páginas.

O escritor moçambicano dá voz à alma feminina em 29 contos que se entrelaçam em um colar como sugere o título do livro, ou em suas próprias palavras: “A missanga, todos a vêem. Ninguém nota o fio que, em colar vistoso, vai compondo as missangas. Também assim é a voz do poeta: um fio de silêncio costurando o tempo.” Desse modo vai assim descortinando, com sensibilidade e delicadeza, as tramas dos personagens evocando no leitor ora um breve sorriso – “Quem disse que a televisão não fabrica as atuais magias?” (O Mendigo Sexta-Feira jogando no Mundial pg. 84), outras tantas revelando a angústia das mulheres abandonadas e esquecidas, conduzindo-nos a uma cumplicidade com o narrador – ”O cão se habitua a comer sobras. Como eu me habituei a restos de vida” (Os olhos dos mortos pg.70). Através dos diálogos e dando voz aos pensamentos desses narradores o escritor vai revelando as incompreensões, as desilusões e os sonhos interrompidos repletos de lirismo e humanidade dessas figuras igualmente desesperançadas e quase que sem vida.

Seu romance Terra Sonâmbula foi considerado um dos dez melhores livros africanos do século XX, escritor consagrado Mia Couto através de suas belas metáforas vai construindo um texto que se revela em falas comoventes, plenas de significado como revela a moça, que nem nome tinha: “Na minha vila, as mulheres cantavam. Eu pranteava. Apenas quando chorava me sobrevinham belezas. Só a lágrima me desnudava, só ela me enfeitava”. (A saia almarrotada pg.31).

José Carlos Neves machado – médico escolar