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sábado, 31 de agosto de 2013

A GUARDADORA DE GANSOS (conto)







A GUARDADORA DE GANSOS
Irmãos Grimm

Num reino muito distante vivia uma velha viúva com a sua única filha. Embora amasse muito a filha, quando ela atingiu a maioridade, consentiu o seu noivado com um príncipe de uma terra distante, para que ambos os reinos se unissem, mesmo que a princesa e o príncipe nunca se tivessem visto.
A princesa partiu então para o reino do seu noivo com um suntuoso enxoval, rico em jóias e ouro, e acompanhada por uma das damas de companhia da sua mãe. Ambas as moças iriam viajar a cavalo. O cavalo da princesa chamava-se Falada, porque sabia falar. No entanto, essa capacidade era apenas conhecida pela princesa.
Na hora das despedidas, a sós nos seus aposentos, a rainha cortou o pulso com um punhal e deixou cair três gotas de sangue num lenço e entregou-o à filha, dizendo-lhe para guardá-lo junto ao seu peito porque a poderia ajudar na viagem, protegendo-a. As despedidas prolongaram-se - a princesa era muito amada por todos no reino - até que, ao início da tarde, partiram em direção ao reino distante.
Tinham passado algumas horas quando a princesa sentiu sede. Viajava sozinha com a dama de companhia e pediu-lhe que lhe trouxesse um pouco de água. No entanto, a dama replicou que não seria criada dela nem durante, nem após a viagem e que, se a princesa tinha sede, então que fosse ela mesma a ir buscar água. A princesa nada disse ao ouvir tão seco comentário. Ao debruçar-se num riacho ali perto, a princesa suspirou de tristeza e, uma voz vinda do lugar onde trazia o pequeno lenço, disse-lhe: "Se a tua mãe visse isto, o seu coração iria se partir de tristeza". A princesa voltou para o seu cavalo e nada mais disse.
Algum tempo depois a princesa sentiu sede de novo e, esquecendo as palavras duras que a dama de companhia havia dito anteriormente, pediu-lhe para lhe trazer um pouco d'água. E de novo a aia lhe respondeu que não seria criada dela. A princesa dirigiu-se ao rio, que passava por ali, e, perdida nos seus pensamentos, deixou cair o seu lenço que trazia junto ao coração quando abaixou-se para apanhar água para beber. Não reparou que perdera o talismã que seguiu pela correnteza das águas, mas a dama observou toda a cena. Isso a fez sentir-se mais poderosa sobre a princesa, uma vez que esta já não se encontrava sob a proteção da velha rainha. Assim que a princesa regressou a Falada, a dama exigiu que trocassem de cavalo e de roupas, para que fosse ela a casar com o príncipe. A princesa não poderia contar nada a ninguém ou seria morta. Esta assentiu e nada mais disse durante toda a viagem. O único que se mantinha atento e relutante era Falada.
Ao chegarem ao reino, a dama finge-se princesa e todos acreditam, pois transporta um enxoval e vestuário corresponde ao reino de onde vinha e estava usando os trajes da princesa. A verdadeira princesa é deixada no pátio, junto a Falada. Dentro da corte, a dama, reclama da viagem e lembra-se de os ver muitas vezes sussurrar um com o outro, parecendo-lhe que conspiravam contra ela e, de imediato, pede ao rei que mate o cavalo, argumentando que estava cheia de dores por sua culpa. Na verdade, a aia tinha medo que o cavalo pudesse revelar a farsa que inventara. Pediu também para que encarregassem a moça que a acompanhara com um trabalho qualquer, pois não gostaria que frequentasse o palácio. O rei consente os pedidos da futura nora e manda matar de imediato o cavalo. E resolveu dar à princesa a tarefa de ser agora uma guardadora de gansos...
Ao saber que Falada tinha sido morto, a princesa promete ao carrasco que fez o serviço uma soma de ouro que havia conseguido esconder da aia, se ele, ao menos conservasse a cabeça do cavalo e não a enterrasse. Como ele gostava da bela jovem, atendeu a seu pedido e após embolsar o ouro prometido, pendurou a cabeça do cavalo numa das portas da cidade, a mais escura, por onde a princesa costumava passar sempre que ia guardar os gansos.
Todas as manhãs ia com Conrado, um rapazinho que já cuidava do bando, guardar os gansos conduzindo-os para um prado nas imediações do castelo. Ao passar pela porta, ela e Falada cumprimentavam-se, ouvindo-se sempre a invariável frase que o cavalo repetia: "Se a tua mãe visse isto, o seu coração se partiria de tristeza". Ao chegarem ao prado Conrado aproximava-se muito da princesa, admirando seus lindos cabelos e com a intenção de roubar alguns cabelos dourados como o ouro da delicada cabeleira da sua companheira. No entanto, ela encantava o vento e o boné que Conrado trazia sempre em sua cabeça voava pelos céus afora para bem longe dali. A princesa podia então pentear os seus cabelos em paz e o rapaz só conseguia voltar com seu chapéu quando ela já tinha terminado de se pentear.
Um dia, Conrado, farto de tanta correria, dirigiu-se ao rei e pediu-lhe para arranjar outra pessoa para guardar os gansos com ele. O rei não entende o pedido do rapaz que explica ao rei que acontecem coisas muito estranhas sempre que ele vai para o prado com a dama da princesa. Ao ouvir o relato, o rei pede-lhe para ir mais algumas vezes com ela, para que ele pudesse ver a situação com os seus próprios olhos.
Após ver algumas vezes as idas e vindas até o prado, o rei esperou a princesa na casinha onde ela vivia. Aí perguntou-lhe por que razão estava sempre infeliz e por que se comportava assim. A princesa baixou os olhos, dizendo que não podia, de forma alguma contar-lhe, pois estaria a quebrar um juramento. O rei fingiu-se desanimado, mas, como era esperto e desconfiava de que havia algum segredo que aquela bela jovem escondia, aconselhou-a para, ao menos, confiar a verdade e desabafar as mágoas dentro de um enorme forno de metal que tinha em um dos salões do palácio e que não era mais usado. 
Assim que o rei saiu de sua casa, a princesa irrompeu em lágrimas e resolveu seguir o conselho e desabafou toda sua triste história dentro do forno. Na verdade, o rei encontrava-se apenas do lado de fora da porta esperando a moça revelar seu segredo, ao ouvir o lamento, o rei chamou a princesa, prometeu ajudá-la e levou-a ao seus aposentos reais. Mandou chamar o príncipe e explicou ao filho o que tinha acontecido, o que deixou o rapaz muito satisfeito, pois não havia simpatizado com sua noiva, que era muito prepotente e antipática. Ao ver a verdadeira princesa, o príncipe comoveu-se com a sua coragem e honra e prometeu vingá-la.
Nessa noite, a princesa participou do jantar sentando-se junto dos membros da família real, vestida com trajes dignos de uma princesa que era. Contudo, a sua dama de companhia não a reconheceu e nem se deu conta do que viria a seguir. O rei pediu a atenção de todos e decidiu contar a história da princesa, inquirindo os presentes sobre o castigo a ser atribuído àquela que teria cometido tamanha traição. A aia que havia tomado o lugar da princesa verdadeira que, tinha tanto de feia como de ignorante, não se apercebeu do que se passava, e sugeriu um castigo horripilante para a malfeitora - colocar essa malvada dentro de um barril repleto de facas e fazê-lo rolar por todas as ruas da cidade. O rei então apresentou a verdadeira princesa e anunciou que o castigo da falsa acabava de ser decidido...e foi isso que aconteceu de fato.
O príncipe e a princesa se casaram após a sentença ter sido cumprida e viveram felizes para sempre.

JOÃO FIEL (conto)






JOÃO FIEL 

Irmãos GrimmAtenção, abrir em uma nova janela. 



Houve uma vez, um velho rei que, sentindo-se muito doente pensou: "Este será o meu leito de morte!” – disse então aos que o cercavam:
- Chamem o meu fiel João.
O fiel João era o seu criado predileto, assim chamado porque durante toda a vida, fora-lhe extremamente fiel. Portanto, quando se aproximou do leito onde estava o rei, este lhe disse:
- Meu fidelíssimo João, sinto que estou me aproximando do fim; nada me preocupa, a não ser o futuro do meu filho; é um rapaz ainda inexperiente e, se não me prometeres ensinar-lhe tudo e orientá-lo no que deve saber, assim como ser para ele um pai adotivo, não poderei fechar os olhos em paz.
- Não o abandonarei nunca – respondeu o fiel João – e prometo servi-lo com toda a lealdade, mesmo que isso me custe a vida.
- Agora morro despreocupado e em paz – exclamou o velho rei, e acrescentou: 
- Depois da minha morte, deves mostrar-lhe todo o castelo, os aposentos, as salas e os subterrâneos todos, com os tesouros que encerram. Exceto, porém, o ultimo quarto do corredor comprido, onde está escondido o retrato da princesa do Telhado de Ouro; pois, se vir aquele retrato ficara ardentemente apaixonado por ela, cairá em um sono profundo e, em consequência disso, irá correr grandes perigos dos quais eu te peço que o livres e o preserve. 
Assim que o fiel João acabou de apertar, ainda uma vez, a mão do velho rei em sinal de obediência este finalmente silenciou, reclinou a cabeça no travesseiro e morreu.
O velho rei foi enterrado com todas as honras e, passados alguns dias, o fiel João expôs ao príncipe o que lhe havia prometido ao seu pai pouco antes de sua morte, acrescentando:
- Cumprirei minha promessa feita ao vosso pai. Ser-te-ei fiel como o fui para com ele mesmo, mesmo que isso me custe a vida.
Transcorrido o período de luto, o fiel João disse-lhe:
- Já é tempo que tomes conhecimento das riquezas que herdaste; vamos, vou mostrar-te o castelo de teu pai.
Conduziu-o por toda parte, de cima até embaixo, mostrando-lhe os aposentos com o imenso tesouro, evitando, porém uma determinada porta: a do quarto onde se achava o retrato perigoso. Este estava colocado de maneira que ao abrir a porta, era logo visto; e era tão maravilhoso que parecia vivo, tão lindo, tão delicado que nada no mundo lhe podia comparar. O jovem rei notou que o fiel João passava sempre sem parar diante daquela única porta e, curiosamente perguntou:
- E essa porta, porque não abres nunca para que também possa saber o que tem?
- Não abro porque há lá dentro algo que te assustaria – respondeu o criado.
O jovem rei, porém insistiu:
- Já visitei todo o castelo, agora quero saber o que há lá dentro.
E foi se encaminhando em direção à porta, decidido a abri-la e entrar no quarto. O fiel João deteve-o, suplicando:
- Prometi a teu pai, momentos antes de sua morte, que jamais verias o que lá se encontra, porque isso seria causa de grandes desventuras para ti e para mim.
- Não, não – replicou o jovem – a minha desventura será ignorar o que há lá dentro, pois não terei mais sossego, enquanto não conseguir ver com meus próprios olhos o que existe por trás dessa porta. Não sarei daqui enquanto não abrires essa porta - falou decidido o rapaz.
Vendo que nada adiantava opor-se à decisão do jovem, o fiel João, com o coração apertado de angustia, procurou no grande molho a chave indicada. Tendo aberto a porta, entrou em primeiro lugar, pensando assim, encobrir com seu corpo a tela, a fim de que o rei não a visse. Nada adiantou, porém, porque o rei erguendo-se nas pontas dos pés, olhou por cima de seu ombro e conseguiu vê-la.
Mal avistou o retrato da belíssima jovem, resplandecente de ouro e pedrarias, caiu por terra desmaiado. O fiel João precipitou-se logo sobre ele e carregou-o para a cama, enquanto pensava, cheio de aflição: “A desgraça aconteceu; Ah! Senhor Deus, que acontecerá agora?” Procurou reanimá-lo, dando-lhe uns goles de vinho, e assim que o rei recuperou os sentidos, suas primeiras palavras foram:
- Ah! De quem é aquele retrato maravilhoso?
- É da princesa do Telhado de Ouro – respondeu o fiel João.
- Meu amor por ela, - acrescentou o rei - É tão grande que, se todas as folhas das árvores fossem línguas, ainda não bastariam para exprimi-lo; arriscarei, sem hesitar, minha vida para conquistá-la; e tu, meu fidelíssimo João, deves ajudar-me.
O podre criado meditou, longamente, na maneira conveniente de agir; porquanto, era muito difícil chegar à presença da princesa. Após muito refletir, descobriu um meio que lhe pareceu ser o mais adequado e comunicou ao rei.
- Tudo o que circunda a princesa é de ouro: mesas, cadeiras, baixelas, copos, vasilhas, enfim, todos os utensílios de uso doméstico são de ouro. Aqui no teu castelo, em teu tesouro há cinco toneladas de ouro; então, reúne os ourives da corte e manda cinzelar todo esse ouro; que seja transformado em toda espécie de vasos e objetos ornamentais: pássaros, feras e animais exóticos; isso agradará a princesa; a seguir iremos nos apresentar diante dela oferecendo todas essas coisas e tentaremos a sorte.
O jovem rei achou aquele conselho muito bom e convocou todos os ourives do reino e estes passaram a trabalhar dia e noite até aprontar aqueles esplêndidos objetos. Uma vez tudo pronto, foi carregado para um navio; o fiel João disfarçou-se em mercador e o rei teve de fazer o mesmo para não ser reconhecido. Em seguida zarparam, navegando longos dias até chegarem à cidade onde morava a princesa do Telhado de Ouro.
O fiel João aconselhou o rei a que permanecesse no navio esperando por ele que seguiria na frente.
- Talvez eu traga comigo a princesa - disse ele - Portanto, providencia para que tudo esteja em ordem; mande expor todos os objetos de ouro pelo convés e também que o navio fique caprichosamente adornado com esses belos enfeites.
Juntou, depois, diversos objetos de ouro no avental, desceu à terra e dirigiu-se diretamente ao palácio real onde vivia a princesa do Telhado de Ouro. Chegando ao pátio do palácio, avistou uma linda moça tirando água da fonte com dois baldes de ouro. Quando ela se voltou, carregando a água cristalina, deparou com o desconhecido e perguntou-lhe quem era.
- Sou um mercador - respondeu João, abrindo o avental e mostrando o que trazia.
- Ah! Que lindos objetos de ouro! – exclamou a moça.
Descansou os baldes no chão e pôs-se a examiná-los um por um.
- A princesa deve vê-los - disse ela; gosta tanto de objetos de ouro que, certamente, os comprará todos.
Tomando-lhe a mão, conduziu-o até aos aposentos superiores, que eram os da princesa. Quando esta viu a esplêndida mercadoria disse encantada:
- Estão todos tão bem cinzelados e perfeitos que desejo comprá-los todos.
O fiel João, porém, disse-lhe:
 - Eu sou apenas o criado de um rico mercador; o que tenho aqui não é nada comparado ao que meu amo tem em seu navio; o que de mais artístico e precioso se tenha já feito em ouro, ele tem lá.
Ele pediu que lhe trouxessem tudo, mas o fiel João retrucou:
 - Para isso seriam necessários muitos dias, tal a quantidade de objetos. Seriam necessárias também muitas salas para que pudessem ficar devidamente expostos para que Vossa Alteza pudesse apreciá-los.
Espicaçou-lhe assim a curiosidade e o desejo; então ela concordou em ir até ao navio ver de perto essas maravilhas, então disse a ele:
- Leva-me até o navio então, quero ver pessoalmente os tesouros que teu amo tem a bordo.
Radiante de felicidade, o fiel João conduziu-a a bordo do navio e quando o rei a viu achou que era ainda mais bela do que no retrato; seu coração ameaçava saltar-lhe do peito de tanta alegria. O rei recebeu-a e a acompanhou-a ao interior do navio. O fiel João, porém, ficou junto ao timoneiro, ordenando-lhe que zarpasse depressa, assim que a princesa colocou os pés no convés.
- A toda vela, faça com que voe como um pássaro no ar - disse ele ao marujo.
Entretanto, o rei ia mostrando à princesa, um por um, os maravilhosos objetos de ouro: pratos, copos, vasilhas, pássaros, feras e monstros, exaltando-lhes as formas e o fino cinzelamento. Passaram, assim, muitas horas na contemplação daquelas obras de arte; em sua alegria ela nem sequer percebera que o navio estava navegando para bem longe de seu palácio. Tendo examinado o último objeto, agradeceu ao mercador, dispondo-se a voltar para casa; mas chegando ao tombadilho, viu que o navio corria a toda vela rumo ao mar alto, distante, muito distante da costa.
- Ah! - gritou apavorada  - Enganaram-me! Fui raptada, estou à mercê de um vulgar e mentiroso mercador, prefiro morrer!
O rei, então, pegando-lhe a mãozinha disse:
- Não sou um simples mercador; sou um rei de nascimento e meu reino não é inferior ao seu. Se usei de astúcia para te raptar, assim o fiz por excesso de amor. Quando vi pela primeira vez teu retrato, a emoção em ver seu rosto esplêndido me fez desmaiar.
Ouvindo essas palavras, a princesa do Telhado de Ouro sentiu-se confortada e de tal maneira que seu coração se prendeu ao coração do jovem rei e consentiu em se tornar sua esposa.
O navio continuava em mar alto e os noivos extasiavam-se a contemplar aqueles objetos todos; enquanto isso, o fiel João; sentado à proa, divertia-se a tocar o seu instrumento; quando viu, de repente, três corvos esvoaçando, que pousaram ao seu lado. Parou de tocar, a fim de ouvir o que grasnavam, pois tinha o dom de entender a sua linguagem. Um deles grasnou:
- Eis aqui o jovem que vai levando para casa a princesa do Telhado de Ouro!
- Sim! - Respondeu o segundo corvo - Mas ela ainda não lhe pertence!
- Pertence, sim! - Replicou o terceiro - Afinal ela está aqui no navio com ele.
Então o primeiro corvo tornou a grasnar:
- Que adianta? Quando desembarcarem, sairá a seu encontro um cavalo alazão, o rei tentará montá-lo; se o conseguir, o cavalo fugirá com ele, alcançando-se em vôo pelo espaço, e nunca mais ele voltará a ver a sua princesa.
- E não há salvação? – perguntou o segundo corvo.
- Sim, se um outro se lhe antecipar e montar rapidamente no cavalo; pegar o arcabuz que está no coldre e conseguir com o mesmo matar o cavalo; só assim o rei estará salvo. Mas quem é que está a par disso? Se, por acaso, alguém o soubesse e prevenisse o rei dessa desdita, suas pernas, dos pés aos joelhos, se transformariam em pedra, tão logo começasse a falar.
O segundo corvo falou:
- Eu sei de mais coisas: mesmo que matem o cavalo, o jovem rei não conservará a noiva, pois, ao chegarem ao castelo, encontrarão numa sala um manto nupcial que lhes parecerá tecido de ouro e prata, ao invés disso é tecido de enxofre e de pez. Se o rei o vestir, queimar-se-á até a medula dos ossos.
O terceiro corvo perguntou:
- E não há salvação?
- Oh, sim! - Respondeu o segundo corvo
- Se alguém tendo calçado luvas, agarrar depressa o manto e o atirar ao fogo para que se queime, o jovem rei estará salvo. Mas que adianta se ninguém sabe disso? E se soubesse e prevenisse o rei, se transformaria em pedra desde os joelhos até o coração.
O terceiro corvo, por sua vez, falou:
- Eu ainda sei de mais uma coisa: mesmo que queimem o manto, ainda assim o jovem rei não terá a noiva; pois, após a cerimônia de núpcias, quando começar o baile e a jovem rainha for dançar, ficará repentinamente pálida e cairá no chão como morta. E se alguém não a acudir depressa e não sugar três gotas de sangue de seu seio direito, cuspindo-o em seguida, ela morrerá. Mas se alguém souber disso e o revelar ao rei, ficará inteiramente de pedra desde a cabeça até as pontas dos pés.
Finda essa conversa, os corvos levantaram vôo e sumiram. O fiel João, que tudo ouvira e entendera, tornou-se, desde então, tristonho e taciturno. Se não contasse o que sabia ao seu amo, este iria de encontro à própria infelicidade; por outro lado, porém, se lhe revelasse tudo, seria a própria vida que sacrificaria. Por fim resolveu-se: “Devo saldar meu amo, mesmo que isso me custe a vida”.
Quando, portanto, desembarcaram, sucedeu exatamente o que havia predito o corvo: surgiu em sua direção um belo cavalo alazão.
- Muito bem! – exclamou o rei  - Este cavalo me levará ao castelo, e fez menção de montá-lo.
Porém, o fiel João, antecipou-se e saltou na sela, tirou o arcabuz do coldre e, num instante, abateu o cavalo. Os outros acompanhantes do rei, que não simpatizavam com o fiel João, exclamaram indignados:
- Que absurdo! Matar um animal tão belo! Tão apropriado para levar nosso rei ao castelo!
- Calem-se, deixem-no fazer o que achar conveniente; sendo meu fidelíssimo João, deve ter motivos razoáveis para agir assim.
Encaminharam-se todos para o castelo; na sala depararam com o manto nupcial, que parecia tecido de ouro e prata, sobre uma salva. O jovem rei logo quis vesti-lo, mas o fiel João, com gesto rápido afastou-o e, de mãos enluvadas, agarrou o manto e o lançou ao fogo, que o consumiu imediatamente, causando indignação nos observadores. Novamente os acompanhantes do rei tornaram a protestar contra esse atrevimento:
- Vejam só! Ousa queimar até o manto nupcial do rei! Que petulância e que atrevimento tem esse João!
Mas o rei tornou a interrompê-los, defendendo seu protegido:
- Calem-se! Deve haver um sério motivo para isso; deixem que faça o que deseja, ele é meu fidelíssimo João e tem a minha aprovação.
Tiveram inicio as bodas, com grandes festejos. Chegando a hora do baile, também a noiva quiz dançar; o fiel João, atento às menores coisas, não deixava de observar-lhe o rosto; de súbito, viu-a empalidecer e cair no chão como morta. De um salto, aproximou-se dela, tomou-a nos braços e carregou-a para o quarto, reclinando-se em seu leito; ajoelhando-se ao lado da cama, sugou-lhe do seio direito três gotas de sangue e cuspiu-as. Com isso ela imediatamente recuperou os sentidos e voltou a respirar normalmente. O jovem rei, porém, que a tudo assistia, acompanhando toda a cena, sem comprometer as atitudes do fiel João, ficou furioso com a ousadia do seu servo e ordenou:
- Prendam-no já! Levem-no para o cárcere agora!
Na manhã seguinte, o fiel João foi julgado e condenado à morte. Levaram-no ao patíbulo, mas, no momento de ser executado, de pé sobre o estrado, resolveu falar.
- Antes de morrer, todos os condenados têm direito de falar; terei eu também esse direito?
- Sim, sim.! Isso eu não posso negar – anuiu o rei.
Então o fiel João revelou a verdade a toda a corte:
- Estou sendo injustamente condenado; sempre te fui fiel Magestade. 
E narrou, detalhadamente, a conversa que ouviu dos corvos no tombadilho do navio quando navegavam para o reino. E agiu desse modo com a intenção de salvar o rei, seu amo e que não se arrependera por sua atitude. Então, após ouvir toda a narrativa de João, muito comovido, o rei exclamou:
- Oh! Meu fidelíssimo João, perdoa-me! Perdoa-me por tê-lo julgado injustamente! Guardas: soltem-no imediatamente.
Porém, assim que acabara de pronunciar as ultimas palavras, o fiel João caiu inanimado, transformado em uma estátua de pedra.
A rainha e o rei entristeceram-se profundamente, e este ultimo em prantos, lamentava-se:
- Ah! Como recompensei mal tamanha fidelidade!
Deu ordens para que a estátua de pedra fosse colocada em seu próprio quarto, ao lado da cama. Cada vez que seu olhar caía sobre ela, desatava a chorar, lamuriando-se:
- Ah! Se me fosse possível restituir-te a vida, meu caro, meu fiel João, como lamento tudo o que houve...
Decorrido algum tempo, a rainha deu a luz dois meninos gêmeos, os quais cresceram fortes e bonitos e constituíam sua maior alegria. Uma ocasião, enquanto a rainha se encontrava na igreja e os dois meninos brincavam junto do pai, este volveu-se entristecido para a estatua suspirando:
- Se pudesse restituir-te a vida, meu fiel João!
Então viu a pedra animar-se e falar:
- Sim! – disse uma voz saindo de dentro da estátua
- Está em seu poder restituir-me a vida, porém isso poderá lhe custar caro demais.
Assombrado com essa revelação, o rei exclamou:
- Por ti darei o que me seja mais caro nesse mundo!
A pedra então continuou:
- Pois bem; se, com tuas próprias mãos, cortares a cabeça de teus dois filhinhos e me friccionares com o sangue deles, eu recuperarei a vida.
O rei ficou horrorizado à idéia de ter que matar seus amados filhos; mas lembrou-se daquela fidelidade sem par que lhe dedicara o fiel João, a ponto de morrer para salvá-lo e não hesitou mais: sacou a espada e decepou a cabeça dos filhos. Depois friccionou com o sangue deles a estátua de pedra e esta logo se reanimou aparecendo-lhe à sua frente vivo e são o seu fiel João.
- A tua lealdade, – disse-lhe o rei, não poderia ficar sem recompensa.
João então, apanhando as cabeças dos meninos, recolocou-as sobre os troncos; untou-lhes o corte com o sangue deles e, imediatamente, os garotos voltaram a saltar e a brincar como se nada houvesse acontecido.
O rei ficou radiante de alegria; quando viu a rainha que vinha voltando da igreja, escondeu o fiel João e os meninos dentro de um armário. Assim que ela entrou, perguntou-lhe:
- Foi a igreja rezar?
- Sim, respondeu ela – mas não cessei de pensar no fiel João; por nossa causa ele foi tão desventurado!
Então o rei insinuou:
- Minha querida mulher, nós poderíamos restituir-lhe a vida; mas custa a vida de nossos filhinhos. Acha que devemos sacrificá-los?
A rainha empalideceu, sentindo o sangue gelar suas veias; contudo animou-se e disse:
- Pela incomparável fidelidade que nos dedicou acho que era isso o que deveríamos fazer, caso fosse essa a última possibilidade.
Felicíssimo por ver que a rainha concordava com ele, o rei abriu o armário e fez sair as crianças e o fiel João.
- Graças a Deus – disse o rei – aqui está nosso querido João vivo e saudável e temos os nossos filhinhos.
Depois contou-lhe detalhadamente o ocorrido. E, a partir de então, viveram todos juntos, alegres e felizes, até o fim da vida.

O ALFAIATEZINHO VALENTE (conto)






O ALFAIATEZINHO VALENTE
Irmãos Grimm.


Era uma vez, num país muito distante, um modesto alfaiate que vivia costurando alegremente na frente da janela da sua casinha, quando, num dia como outro qualquer, ouviu, do lado de fora, um homem anunciando geléia para vender.

- Geléia de morango! Deliciosa geléia! Quem vai querer? - anunciava o vendedor.

O alfaiate ficou com água na boca e mais que depressa comprou um pote de geléia vermelha e cheirosa. Passou uma boa camada de geléia numa fatia de pão, que deixou na mesa para comer depois de terminar o trabalho.
E continuou a costurar, cantarolando. Mas a geléia deu água na boca também de umas moscas, que voaram zumbindo para cima dela. O alfaiate não gostou nada de ver as moscas avançando na sua geléia. 

- Mas que atrevimento!, exclamou ele.
- Vocês já vão ver o que é gostoso!
E, com a própria costura que tinha na mão, ele deu tamanho golpe na mesa, que esparramou a geléia, mas em compensação achatou sete moscas duma vez! O alfaiate ficou tão orgulhoso da sua proeza, que bordou no seu cinto estas palavras: "Sete de um golpe só!" E resolveu sair pelo mundo, para mostrar a toda a gente como ele era valente. Pôs um pedaço de queijo na sacola e pegou a estrada. No caminho, encontrou um passarinho caído no chão e, com pena dele, colocou-o na sacola, junto com o queijo. Continuou andando, muito alegre. Foi andando ladeira acima, ladeira abaixo, e no alto de um morro deu de repente com um homem enorme. Mas não se intimidou, e falou com o gigante:
- Estou andando pelo mundo para mostrar como sou valente! Leia só isto!

E mostrou o seu cinto ao homenzarrão.

- "Sete de um golpe só!," leu o homem, e ficou muito impressionado, pensando que o pequeno alfaiate matara sete homens de um golpe só.

Só para tirar a dúvida que tinha, o gigante pegou uma pedra e esmagou-a nas mãos, com a maior facilidade.

- Isto para mim é canja!, disse o alfaiate. 

Tirando o seu queijo da sacola, esmagou-o nas mãos, sem o menor esforço. O gigante, que era míope ou burro, ou ambas as coisas, tornou a ficar impressionado. Mas queria certificar-se mais ainda. Então, ele apanhou outra pedra e atirou-a ao ar até uma nuvem que passava. O nosso alfaiate mais uma vez não se deu por achado: tirou da sacola o passarinho que encontrara na estrada, e jogou-o para o alto.
O pássaro, feliz por se ver livre novamente, voou para cima, até sumir de vista. Desta vez, o gigante ficou tão espantado, que achou melhor tratar bem aquele baixinho tão perigoso, e convidou-o a passar a noite na sua casa, convite que este aceitou, pois já estava anoitecendo. Na calada da noite, quando o alfaiate dormia na sua enorme cama, com inveja e receio do seu pequeno hóspede, o gigante resolveu matá-lo, quebrando pelo meio a cama onde seu hóspede dormia, encolhido num canto debaixo das cobertas. Por estar tão encolhidinho o alfaiate escapou da morte, sem que o malvado percebesse nada. De manhã, o pequeno alfaiate se plantou na frente do gigante, ameaçando-o de mãos na cintura. O grandão ficou tão apavorado que saiu correndo, aos berros de pavor!
Os seus gritos foram ouvidos pelos soldados da guarda real, que ficaram espantados ao ver o terrível gigante fugir gritando do nosso valente alfaiate.
Quando os soldados lhe perguntaram quem era, foi só mostrar-lhe o seu cinto com "sete de um golpe só" bordado, para eles acharem melhor conduzir o herói ao palácio, e apresentá-lo ao rei.
O rei, a rainha e a princesa ficaram cheios de admiração pelo pequeno valentão, que todo gentil e mesuroso, ofereceu seus serviços a Sua Majestade.
O rei gostou da idéia e aceitou o oferecimento. A princesa até sorriu para o pequeno alfaiate...
Assim, o baixinho ficou morando numa bonita casinha perto do palácio, onde era convidado permanente.
Um dia o rei lhe chamou e disse:
- Tenho um encargo para lhe dar, já que você é tão forte e valente. Existe neste reino dois gigantes malvados que perturbam e assustam todo o meu povo. Se você conseguir livrar-nos deles, eu lhe darei como paga metade do reino e, como prêmio, a mão da princesa em casamento.

Entusiasmado, o alfaiate aceitou a tarefa e se encaminhou direto para a floresta, onde não demorou a encontrar os dois terríveis homenzarrões, dormindo a sesta no campo, de costas um para o outro. Enchendo os bolsos de pedras pontudas, o alfaiate subiu na árvore onde os dois estavam encostados. Fazendo boa pontaria, o alfaiate atirou com força duas pedras na cabeça de um dos gigantes.

- Para com isto!, berrou um gigante, e deu um soco na cara do outro.
- Eu não fiz nada!, reclamou o outro, você está sonhando!
Os dois adormeceram de novo, roncando alto.

O alfaiate esperou um pouco e logo atirou duas pedras na cabeça do segundo gigante, que acordou furioso e partiu para cima do primeiro.
Os dois se engalfinharam numa luta mortal. Eles até arrancaram árvores para bater um no outro!
A briga foi tão violenta, que acabaram os dois caindo mortos!

- Missão cumprida!, disse o alfaiate satisfeito com o que havia provocado.

E voltou ao palácio, para relatar ao rei o seu novo feito heróico. Na hora de dar o prêmio ao alfaiate, o rei não quis cumprir sua promessa,  encomendou-lhe outro encargo:

- Você foi muito valente, disse o rei, mas preciso de mais um serviço seu: quero que você me traga o chifre mágico do unicórnio selvagem, que vive solto na floresta. Antes disso, nada de prêmio.
A princesa ficou desapontada, mas o alfaiate não desanimou.

- Isto será fácil para mim. Matei sete de um golpe só e liquidei dois gigantes malvados. Vou trazer-lhe o tal chifre, Majestade, pode esperar.

E partiu de volta para a floresta. Ele nem andou muito quando, no meio de um descampado, viu investir contra ele, a galope, o enorme unicórnio que era um feroz cavalo branco de chifre na testa. Ágil como um gato, o alfaiate pulou para trás de uma árvore, e o unicórnio, na sua fúria cega, sem poder deter a corrida, espetou o seu chifre no tronco da árvore, e lá ficou preso, sem poder levantar a cabeça. se debatendo em vão. 
Sem perder tempo, o esperto alfaiate tirou da sacola o machado que levara consigo e, com uma machadada certeira, cortou o chifre do bicho, que vendo-se livre, fugiu a galope.
- Muito bem, disse o alfaiate, satisfeito. Esta missão também está cumprida! Quero só ver se Sua Majestade me dará a recompensa agora!

Como o rei achava que o alfaiate não era nobre o bastante para ser seu genro, inventou outra saída. Disse ao alfaiate para ele ficar no palácio, aguardando os preparativos para o casamento com a princesa e que o alfaiate concordou, acreditando na promessa real; n
esse meio tempo, o rei chamou os seus soldados e lhes deu uma ordem:
- Esta noite, quando o alfaiate estiver dormindo, invadam o seu quarto e amarrem-no bem amarrado, que eu vou cuidar de livrar-me dele duma vez por todas!

Mal sabia ele que a princesa estava escondida na escada, escutando tudo. Ela aprendera a gostar do pequeno alfaiate e queria casar-se com ele. Por isso, resolveu avisá-lo do perigo que corria e foi correndo lhe contar das intenções de seu pai:

- Você tem de fugir daqui, meu amor!, disse ela. Fuja sem perda de tempo!

- Não vou fugir! Não quero deixá-la, minha prometida! Eu quero casar com você!

- Eu também quero casar com você!, disse a princesa, mas teremos de esperar por uma hora menos perigosa! Agora, fuja! Salve-se!

- Não vou fugir! - disse o pequeno alfaiate, pois, no fundo era realmente corajoso. 
- Não se preocupe, eu sei o que fazer! Tenho o meu plano.

O nosso alfaiate foi para o seu quarto e fingiu que estava dormindo. Na verdade ele se escondeu atrás da porta e ficou esperando pelos soldados que viriam prendê-lo. Quando os ouviu chegando, deixou que se aproximassem bem, e abrindo a porta de repente, gritou com a sua voz mais forte:

- Eu já matei sete de um golpe só, dei cabo de dois horrendos gigantes e cortei o chifre de um unicórnio selvagem! Não preciso ter medo de sete simples soldadinhos que estão aí fora!

Quando os soldados ouviram isto, tremeram de susto e saíram correndo, apavorados.
Dessa vez o rei não teve desculpas para não cumprir o prometido. Ainda mais porque a princesa teimou que queria casar com o valente alfaiate! Insistiu também que queria metade do reino, como dote de casamento.
Assim, o pequeno alfaiate casou-se com a princesa e virou príncipe-consorte. Um prêmio merecido para o herói que "matou sete de um golpe só!"


TSUKINA WAGUMA (conto)




TSUKINA WAGUMA - O Urso da Meia-Lua

Clarissa Pinkola Estés
Era uma vez uma jovem mulher que vivia numa perfumada floresta de pinheiros. Seu marido esteve fora, lutando na guerra, muitos anos. Quando ele afinal foi liberado, voltou para casa com o pior dos humores. Ele se recusou a entrar na casa pois havia se acostumado a dormir nas pedras. Ele só queria ficar sozinho e permanecia na floresta tanto de dia quanto à noite.
A jovem esposa ficou muito feliz quando soube que o marido estava afinal voltando para casa. Ela cozinhou e fez compras, e fez compras e cozinhou. Preparou pratos e mais pratos, tigelas e mais tigelas, de delicioso queijo branco de soja, três tipos de peixe, três tipos de algas, arroz salpicado com pimenta vermelha e belos camarões frios, grandes e alaranjados.
Com um tímido sorriso, ela levou os alimentos até o bosque e se ajoelhou ao lado do marido esgotado pela guerra, oferecendo-lhe a bela refeição que havia preparado. No entanto, ele se pôs de pé e chutou as travessas de modo que o queijo de soja caiu, os peixes saltaram no ar, as algas e o arroz caíram na terra e os grandes camarões alaranjados rolaram pelo caminho abaixo.
— Deixe-me em paz! — rugiu ele, voltando-lhe as costas. 
Estava tão furioso que ela sentiu medo dele. E afinal, em desespero, ela foi procurar a gruta da curandeira que morava fora da aldeia.
— Meu marido foi ferido gravemente na guerra — disse a esposa. 
— Ele sofre de uma raiva permanente e não come nada. Só quer ficar ao ar livre e não se dispõe a voltar a viver comigo. A senhora não pode me dar uma poção que faça com que ele volte a ser carinhoso e gentil como antes?
— Isso eu posso fazer por você — asseverou-lhe a curandeira.           — Mas vou precisar de um ingrediente especial. Infelizmente, acabou todo meu pelo de urso de meia-lua. Por isso, você deve subir a montanha, encontrar o urso negro e me trazer um único pelo da meia-lua que ele tem no pescoço. Depois, eu lhe darei o que você precisa, e a vida voltará a ser boa.
Algumas mulheres teriam se sentido desencorajadas com essa tarefa. Algumas teriam considerado que todo esse esforço era impossível. Mas não ela, pois ela era uma mulher que amava.
— Ah! Como lhe sou grata! É tão bom saber que existe uma solução.
E assim ela se preparou para a viagem e na manhã seguinte partiu para a montanha.
— Arigato zaishö — dizia ela, o que é uma forma de cumprimentar a montanha e lhe dizer "Obrigada por me deixar escalar seu corpo".
Ela se embrenhou nos contrafortes, onde havia rochas semelhantes a grandes pães de forma. Subiu até um platô coberto de mata. As árvores tinham galhos longos e caídos e folhas que se pareciam com estrelas.
— Arigato zaishö — entoou. Era uma forma de agradecer as árvores por erguerem seus cabelos para que ela pudesse passar por baixo. E assim ela conseguiu atravessar a floresta e começou a subir de novo.
Agora estava mais difícil. A montanha tinha flores espinhosas que se prendiam na barra do seu quimono e rochas que arranhavam suas mãos delicadas. Estranhos pássaros escuros saíram voando na sua direção no crepúsculo, deixando-a assustada. Ela sabia que eles eram os muen-botoke, espíritos dos mortos que não tinham parentes. Ela entoou orações para eles.
— Vou ser sua parenta. Vou dar-lhes descanso. 
Ela prosseguia subindo pois era uma mulher que amava e era determinada. Subiu até ver neve no pico da montanha. Logo seus pés estavam frios e molhados, e ela continuava a escalar, pois tinha uma missão a cumprir. Começou uma tempestade, e a neve penetrava direto nos seus olhos e fundo nas suas orelhas. Mesmo sem ver o que estava à sua frente, ela continuava a subir.
— Arigato zaishö — cantou a mulher quando a nevasca parou, para agradecer aos ventos por terem parado de cegá-la. 
Ela então procurou abrigo numa caverna rasa e mal conseguiu lugar para seu corpo inteiro. Embora tivesse uma bolsa cheia de alimentos, ela não comeu, mas se cobriu com folhas e adormeceu. Pela manhã, o ar estava calmo e pode observar que plantinhas verdes chegavam a atravessar a neve aqui e acolá.
— Ah! Agora, vou ao encontro do urso da meia-lua — pensou ela. 
Ela procurou o dia inteiro e quase ao anoitecer encontrou grossos cordões das fezes do animal. E não precisou procurar mais, pois um gigantesco urso negro passou pesadamente pela neve, deixando profundas marcas de patas e garras. O urso da meia-lua deu um rugido feroz e entrou na sua toca. A mulher enfiou a mão na trouxa e colocou numa tigela a comida que trouxera. Ela colocou a tigela do lado de fora da toca e voltou correndo para o seu esconderijo. O urso sentiu o cheiro da comida e saiu cambaleando da toca, rugindo tão alto que pequenas pedras se soltaram do lugar. O urso fez um círculo em volta da comida de uma certa distância, farejou o vento muitas vezes e depois comeu tudo de uma só vez. O enorme urso foi andando de ré e sumiu dentro da sua toca.
Na noite seguinte, a mulher agiu da mesma forma, servindo o alimento na tigela, mas dessa vez não voltou para seu esconderijo, recuando apenas metade do caminho. O urso sentiu o cheiro da comida, saiu pesadamente da toca, rugiu para abalar os céus e as estrelas, deu uma volta, farejou o ar com extremo cuidado, mas afinal engoliu a comida e voltou para a toca. Isso continuou por muitas noites até que numa noite escura a mulher sentiu ter coragem suficiente para esperar ainda mais perto da toca do urso.
Ela pôs a comida na tigela do lado de fora da toca e ficou esperando junto à abertura. Quando o urso sentiu o cheiro e saiu, ele viu não só a comida mas também um par de pequenos pés humanos. O urso virou a cabeça de lado e rugiu tão alto que fez os ossos do corpo da mulher zumbirem.
A mulher tremia, mas não recuava. O urso se ergueu nas patas traseiras, estalou as mandíbulas e rugiu tanto que a mulher pôde ver bem o céu vermelho e marrom da sua boca. Mesmo assim, ela não saiu correndo. O urso rugiu ainda mais e estendeu seus braços como se quisesse agarrá-la, com suas dez garras suspensas como dez facas sobre sua cabeça. A mulher tremia como uma folha ao vento, mas permaneceu onde estava.
— Por favor, meu querido urso  — implorou ela. — Por favor, percorri toda essa distância em busca de uma cura para meu marido.          O urso voltou as patas dianteiras para a terra fazendo voar a neve e olhou direto no rosto assustado da mulher. Por um instante, ela teve a impressão de ver cordilheiras inteiras, vales, rios e aldeias refletidos nos olhos vermelhíssimos do urso. Uma paz profunda caiu sobre ela, e seus tremores passaram.
— Por favor, urso querido, eu venho lhe trazendo aumento todas essas noites. Será que eu podia ficar com um dos pelos da meia-lua do seu pescoço? 
O urso parou e pensou, essa mulherzinha seria fácil de devorar. No entanto, ele de repente se sentiu cheio de pena dela.
— É verdade — disse o urso da meia-lua, sem afastar as garras da sua cabeça. — Você foi boa para mim. Pode ficar com um dos meus pelos. Mas arranque-o rápido, vá embora e volte para sua gente.
O urso ergueu seu enorme focinho para que aparecesse a meia-lua branca do seu pescoço, e a mulher viu ali a forte pulsação do seu coração. A mulher pôs uma das mãos no pescoço do urso, e com a outra segurou um único pelo branco e lustroso. Rapidamente ela o arrancou. O urso recuou e gritou como se estivesse ferido. E essa dor assumiu a forma de bufos irritados.
— Ah, obrigada,  urso da meia-lua,  muitíssimo obrigada.  
A mulher se inclinou em reverência e voltou a se inclinar. Mas o urso rosnou e avançou um passo.
Ele rugiu para a mulher com palavras que ela não entendia e, no entanto, palavras que de algum modo havia conhecido toda a vida. Ela se voltou e correu montanha abaixo com a maior velocidade possível. Ela passou correndo debaixo das árvores de folhas com formato de estrelas. E o tempo todo ela agradecia às árvores por erguerem os galhos para ela passar. Ela veio tropeçando pelas pedras que pareciam grandes pães de forma, sempre agradecendo à montanha por deixar que ela escalasse seu corpo.
Embora suas roupas estivessem esfarrapadas, seu cabelo desalinhado, seu rosto sujo, ela desceu a escada de pedra que levava até a aldeia, seguiu pela estrada de terra atravessando a cidade até o outro lado e entrou na cabana onde a curandeira estava sentada cuidando do fogo. 
— Olhe! Olhe! Consegui, encontrei, consegui arrancar um pelo do urso da meia-lua! — gritou a jovem mulher.
— Que bom — disse a curandeira com um sorriso. Ela examinou a mulher atentamente, pegou o pelo de um branco puríssimo e o segurou perto da luz. Ela sopesou o longo pelo com uma das mãos e o mediu com um dedo e exclamou: 
— É! Este é um autêntico pelo do urso da meia-lua. 
De repente, porém, ela se voltou e lançou o pelo no meio do fogo, onde ele estalou, pipocou e se consumiu numa bela chama laranja.
— Não — gritou a mulher. — O que a senhora fez?
— Fique calma. Está tudo certo. Tudo está bem — disse a curandeira. 
— Você se lembra de cada passo que deu para escalar a montanha? Você se lembra de cada passo que deu para conquistar a confiança do urso da meia-lua? Você se lembra do que viu, do que ouviu e do que sentiu?
— Lembro — disse a mulher. — Lembro-me muito bem.
— Então, minha filha — disse a velha curandeira com um sorriso meigo: 
— Volte por favor para casa com seus novos conhecimentos e proceda da mesma forma com seu marido.

AS ÁRVORES RESSECADAS (conto)





AS ÁRVORES RESSECADAS
Clarissa Pinkola Estés
Era uma vez um homem cujo temperamento irascível lhe havia custado a maior perda de tempo e de bons amigos do que qualquer outro aspecto da sua vida. Ele se aproximou de um velho sábio, vestido em farrapos.
— Como vou poder um dia ter controle sobre esse demônio da raiva? — perguntou-lhe.
O velho recomendou ao homem que se postasse num oásis seco bem longe no deserto, que ficasse ali sentado entre as árvores ressecadas e que puxasse do poço a água salobra para qualquer viajante que por lá passasse.
E o homem, no esforço de dominar a raiva, partiu para o deserto, para o lugar das árvores ressecadas. Durante meses a fio, envolto em mantos e albornoz para se proteger das tempestades de areia, ele puxava a água azeda e a oferecia a todos que chegavam. Anos se passaram, e ele nunca mais sofreu crises de fúria.
Um dia, um cavaleiro sombrio chegou ao oásis morto de cansaço e lançou um olhar de desprezo ao homem que lhe oferecia água numa tigela. O viajante zombou da água turva, recusou-a e começou a se afastar.
O homem que oferecia água foi acometido de uma fúria repentina, tanto que ficou cego de raiva e, puxando o viajante de cima do camelo, matou-o ali mesmo. Que horror! Ele ficou imediatamente aflito por ter sido dominado pela raiva. E vejam ao que ela o havia levado.
De repente, surgiu outro cavaleiro a grande velocidade. Ele .examinou o rosto do morto.
— Graças a Alá, você matou o homem que estava indo assassinar o rei!
Nesse momento, a água turva do oásis tornou-se límpida e doce, e as árvores ressecadas do oásis reverdeceram e irromperam em jubilosa floração

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

ALVA NEVE E ROSA RUBRA (conto)







ALVA NEVE E ROSA RUBRA
Irmãos Grimm

Uma pobre viúva vivia isolada numa pequena cabana. Em seu jardim havia duas roseiras: em uma florescia rosas brancas, e, na outra, rosas vermelhas. A mulher tinha duas filhas que se pareciam com as roseiras: uma chamava-se Rosa-Branca; a outra Rosa Vermelha. As crianças eram obedientes e trabalhadeiras. Rosa-Branca era mais séria e mais meiga que a irmã. Rosa Vermelha gostava de correr pelos campo: Rosa-Branca preferia ficar em casa ajudando a mãe. As duas crianças amavam-se muito e quando saíam juntas, andavam de mãos dadas. Elas passeavam sozinhas na floresta, colhendo amoras. Os animais não lhes faziam mal nenhum e se aproximavam delas sem temor. Nunca lhes acontecia mal algum. Se a noite as surpreendia na floresta elas se deitavam na relva e dormiam.
Uma vez, passaram a noite na floresta e, quando a aurora as despertou, viram uma linda criança, toda vestida de branco sentada ao seu lado. A criança levantou-se, olhou com carinho para elas e desapareceu na floresta.Então viram que tinham estado deitadas à beira de um precipício e teriam caído nele se houvessem avançado mais dois passos na escuridão. Contaram o fato à mãe que lhes disse ser provavelmente o anjo da guarda que vigia as crianças.



As meninas mantinham a choupana da mãe bem limpa. Durante o verão, era Rosa-Vermelha que tratava dos arranjos da casa e no inverno, era Rosa-Branca. Á noite, quando a neve caía branquinha e macia, Rosa-Branca fechava os ferrolhos da porta.
À noite sentavam perto da lareira e enquanto a mãe lia em voz alta num grande livro as mãozinhas das meninas fiavam; aos pés delas, deitava-se um cordeirinho, e atrás, em cima do poleiro, uma pomba muito branca dormia com a cabeça entre as asas.
Uma noite, quando estavam assim tranquilamente sentadas, aproveitando a companhia umas das outras, ouviram bater à porta e a mãe mandou Rosa-Vermelha abrir a porta pois devia ser alguém procurando abrigo. Ao abrir a porta Rosa-Vermelha … um enorme urso meteu sua grande cabeça através da abertura da porta. A menina se assustou e soltou um grito correndo para o quarto; o cordeirinho pôs-se a balir, a pomba a voar, e Rosa-Branca se escondeu atrás da cama da mãe.
- Não tenham medo, – falou o urso. 
- Estou gelado e sinto muito frio, me deixem entrar e me aquecer perto da lareira.
- Pobre animal, disse a mãe.
- Chegue perto do fogo, mas cuidado para não se queimar.
Então a mãe chamou as meninas. Elas voltaram e, pouco a pouco, aproximaram-se o cordeirinho e a pomba, sem medo do urso.
- Meninas, chamou o urso. 
- Por favor tirem a neve que tenho nas costas!
As meninas pegaram a vassoura e limparam o seu pelo; em seguida, o urso estendeu-se diante do fogo, grunhindo satisfeito. Não demorou muito, elas puseram-se a brincar com ele. Puxavam o pelo com as mãos, trepavam nas suas costas ou batiam nele com uma varinha de nogueira. Ele gostou daquela brincadeira, só reclamou quando elas se excederam.
- Rosa-Vermelha e Rosa-Branca, ele disse – tratem o pretendente como se deve!
Quando chegou a hora de dormir e as meninas foram deitar-se, a mãe disse ao urso:
- Fique perto do fogo e você estará ao abrigo do frio e do mau tempo que faz lá fora.
Logo que amanheceu, as meninas abriram a porta ao urso e ele se foi para a floresta, trotando sobre a neve. A partir desse dia, ele voltou todas as noites, à mesma hora. Estendia-se diante do fogo e elas brincavam com ele.
Chega a primavera e tudo se cobre de verde, então o urso disse a Rosa-Branca que tinha que ir embora e não voltaria durante o verão, pois tinha que proteger seus tesouros dos maus anões. No inverno eles permaneciam nas tocas; mas quando o sol derrete a neve eles saem e roubam tudo o que podem; escondendo em suas cavernas.
Ela ficou muito triste e quando abriu a porta para o urso passar, ele esfolou a pele na lingueta da fechadura, e Rosa-Branca pareceu ter visto o brilho de ouro, mas não teve certeza.
Algum tempo depois, a mãe mandou as meninas apanharem gravetos na floresta. Lá chegando, viram uma árvore caída ao solo, e no tronco, entre a relva, qualquer coisa se agitava, pulando de um lado para o outro. Ao se aproximaram, viram um anão de rosto acinzentado, envelhecido e enrugado, com uma barba branca muito comprida. A ponta da barba estava presa numa fenda da árvore. Ao vê-lo Rosa-Vermelha perguntou como sua barba ficara presa na árvore daquele jeito.
- Sua estúpida! Respondeu o anão. 
- Eu quis partir esta árvore para ter lenha miúda na cozinha, porque, com pedaços grandes, o pouco que cozinhamos nas panelas queima logo; nós não precisamos de tanta comida como vocês, gente estúpida e glutona! Tinha introduzido a minha cunha no tronco, mas a maldita madeira é muito lisa, a cunha saltou e a árvore fechou-se tão depressa prendendo minha linda barba. Portanto, não riam de mim suas bobonas!
Mas elas queriam mesmo ajudar o pobre anãozinho e fizeram muitas força para livrar o homenzinho, mas não conseguiram desprender a barba, então Rosa-Vermelha disse a ele que precisariam de ajuda.
- Suas burras! estrilou o anão. 
- Chamar mais gente para que? Não podem ter uma idéia melhor?
- Não fique nervoso... – disse Rosa-Branca. – Vou resolver isto!
E retirou do bolso uma tesourinha e cortou a ponta da barba. Ao se ver livre, o anão agarrou um saco cheio de ouro oculto nas raízes da árvore e, pôs às costas, sem agradecer, saiu resmungando:
- Suas brutas! Cortaram-me a ponta de minha barba! O diabo que vos recompense.



Passado algum tempo, Rosa-Branca e Rosa-Vermelha foram pescar peixes para o jantar. Quando chegaram perto do rio, viram uma espécie de gafanhoto grande saltitando à beira d’água. Correram até lá e reconheceram o anão.
Rosa-Vermelha perguntou: 
- Você quer se jogar na água?
- Não sou tão burro! – gritou o anão.
- É esse maldito peixe que me arrasta para a água.
Para pescar o anão lançou a linha, mas o vento enroscou sua barba na linha e, nesse momento, um grande peixe mordeu a isca do anzol e suas forças não eram suficientes para mantê-lo fora da água, mesmo agarrando-se aos ramos.
As meninas seguraram o anão para desembaraçar sua barba, mas foi necessário usar mais uma vez à tesourinha e cortar outro pedaço da barba. Ele gritou, zangado:
-Isso é coisa que se faça? Suas patas chocas, como se atrevem a desfigurar desse modo a cara de uma pessoa? Já não bastava cortarem minha barba da outra vez, agora cortaram a parte mais bonita!
Pegando um saco de pérolas, escondido numa touceira ele sumiu atrás de uma pedra.
Pouco tempo depois, a mãe mandou as meninas à cidade comprar linha, agulhas, cordões e fitas. O caminho serpeava por uma planície de rochedos. Lá viram um grande pássaro pairando no ar, que depois de descrever um círculo cada vez menor, foi descendo, até cair sobre um rochedo não muito distante. No mesmo instante ouviram um grito.
Correram e viram com horror que a águia segurava nas garras o seu velho conhecido, o anão, e se dispunha a carregá-lo pelos ares. As meninas seguraram o anão com todas as forças, e puxa de cá e puxa de lá, por fim a águia teve de largar a presa. Quando o anão voltou a si do susto, gritou-lhes com voz esganiçada:
- Não podem me tratar com mais cuidado? Estragaram o meu casaco! Suas, palermas desajeitadas!
Depois de ofendê-las, pegou um saco cheio de pedras preciosas e deslizou para dentro da toca, entre os rochedos. Sem se incomodar a ingratidão do homenzinho, elas foram à cidade atrás da encomenda que a mãe havia pedido.
Ao regressarem pela floresta, elas surpreenderam o anão, que tinha despejado o saco de pedras preciosas num lugar limpinho. Os raios do sol caiam sobre as pedras, fazendo-as brilhar tanto, que as meninas, deslumbradas, pararam para as admirar.
- Que fazem aí de boca aberta, suas xeretas? Berrou o anão quando as percebeu.
Seu rosto acinzentado estava vermelho de raiva, ia continuar xingando, quando se ouviu um grunhido surdo e, um enorme urso negro saiu da floresta.
anão deu um pulo de medo, mas não teve tempo de alcançar um esconderijo: o urso cortou-lhe o caminho. Então ele implorou:
- Querido urso eu lhe darei todos os meus tesouros! Deixe eu viver! Você nem me sentirá entre seus dentes. Pegue essas duas meninas gordinhas para o seu estômago!
O urso não ouviu suas palavras; deu-lhe uma forte patada que o estendeu no chão.
As meninas fugiram, mas o urso chamou os seus nomes e elas reconheceram a sua voz e pararam. Quando o urso as alcançou, caiu a sua pele e, surgiu um formoso rapaz, todo vestido de trajes dourados e ele lhes disse:
- Sou filho de um poderoso rei. 
- Este anão malvado me condenou a vagar pela floresta sob a forma um urso depois de ter roubado os meus tesouros e só com sua morte eu poderia me liertar e voltar à forma humana.
Rosa-Branca, pouco tempo depois, casou com o príncipe e Rosa-Vermelha com seu irmão. Partilharam, entre todos, os tesouros que o anão tinha acumulado na caverna e a velha mãe viveu ainda muitos anos tranqüila e feliz junto de suas queridas filhas e as duas roseiras que foram plantadas diante da janela dos seus aposentos. E todos os anos elas continuaram a dar as mais lindas rosas brancas e vermelhas