Pesquisar este blog

segunda-feira, 29 de abril de 2013

A HISTÓRIA DAS ALMÔNDEGAS - conto

Era uma vez uma cozinha num palácio, uma das mais grandiosas que o mundo já vira.
Havia panelas e frigideiras penduradas em todas as paredes e deliciosos ingredientes empilhados, esperando para serem preparados. No meio da cozinha havia uma enorme chaminé e sob ela um magnífico fogão de ferro.
Cinquenta cozinheiros trabalhavam dia e noite para preparar a comida para a mesa do rei. Havia tortas recheadas com carne de pavão, carneiros assados, churrascos e travessas e mais travessas de almôndegas, pois todos sabiam que o prato favorito do rei era almôndegas ao molho branco cremoso.
Um dos cozinheiros subalternos tinha acabado de preparar a última travessa de almôndegas. Ele abriu a grande porta de ferro do forno e inseriu a travessa. O prato começou a arder enquanto a gordura derretia e a temperatura subia. O calor se tornou cada vez mais sufocante e as almôndegas começaram a cozinhar. Elas gritaram para sua líder: "Socorro, socorro, faça alguma coisa, por favor, estamos sendo cozinhadas vivas! Faremos qualquer coisa por você, mas precisa salvar nossa vida!"
A almôndega líder, que era a maior de todas, ergueu-se o máximo que pôde e falou às suas companheiras almôndegas: "Tenham fé, ó almôndegas, eu as salvarei. Prometo que não serão cozinhadas, mas que a salvação chegará da maneira mais extraordinária!" "Qual será a nossa salvação, ó grande líder?" perguntaram as almôndegas. "Virá um remédio refrescante para aliviar suas queimaduras e uma cama perfumada para vocês deitarem e descansarem", respondeu a líder.
Nesse exato momento, a porta do forno foi aberta e um molho branco frio foi vertido sobre as almôndegas. Elas suspiraram de alegria e agradeceram a Deus por salvá-las do fogo terrível.
"Vocês não me escutaram, companheiras almôndegas", declarou a almôndega líder, "Pois prometi um remédio refrescante e, vejam só, ele chegou". Mas então o calor começou a aumentar novamente e algumas das almôndegas, aquelas mais perto da borda da travessa, foram assadas vivas. "Ó líder!", gritaram as outras, "Por favor salve nossa alma! Vamos segui-la até os confins da terra. Simplesmente nos salve deste calor horrível." "Fiquem calmas, minhas almôndegas. Acalmem-se e o fogo resfriará. Prometo a vocês!", disse a líder.
Naquele momento a porta do forno abriu novamente e a grande travessa foi cuidadosamente removida pelo cozinheiro. Ele a sacudiu um pouco para garantir que as almôndegas não estavam grudando no fundo e virou a travessa sobre uma camada de arroz cor de açafrão. O prato estava adornado com ervas e folhas perfumadas. As almôndegas foram transportadas da cozinha pelos corredores do palácio até a sala do trono, onde o próprio rei estava jantando com seus convidados.
As almôndegas não conseguiam acreditar na virada que houve na sua sorte."Eu disse a vocês que nossa má sorte se inverteria", declarou a almôndega maior. "Só precisam acreditar em mim, pois sou sua líder".As outras almôndegas teciam elogios enquanto se ajeitavam na macia camada de arroz. Subitamente o prato foi colocado diante do próprio rei.
Algumas das almôndegas foram ofuscadas pelo brilho das jóias no pescoço dos convidados e outras foram dominadas pelo som dos mísicos tocando sobre um tablado na sala.
Mas então a irmandade das almôndegas foi removida um punhado de cada vez, tiradas da travessa e servidas em pratos individuais. E, pior ainda, bocas famintas ao redor da mesa começaram a devorá-las. "Ó líder, nossa líder", gritaram as almôndegas restantes, "O que está acontecendo conosco? Nossas integrantes estão sendo selecionadas e da maneira mais chocante. Estamos sendo exterminadas".
O próprio rei enfiou um garfo na travessa e perfurouseis almôndegas de uma vez. "Traição!", gritaram as últimas almôndegas. "Como isso pode estar acontecendo conosco?" A essa altura, a almôndega líder estava farta de ouvir sobre os problemas que suas seguidoras almôndegas estavamencarando. Ela gritou para as outras: "Vocês foram refrescadas pelo molho branco medicinal, não foram?" "Sim, nós fomos", gritaram as últimas almôndegas que restavam. "E foram removidas do fogo terrível e colocadas sobre uma cama de arroz branco fresco e tranquilizante, não foram?" "Sim, nós fomos", disseram. "Bem, quando vão compreender que vocês são almôndegas e que estão destinadas ao estômago de homens famintos?"
Logo em seguida, a almôndega líder foi garfada e engolida inteira pelo rei. As últimas almôndegas na travessa continuaram a gritar, berrar e protestar sua recusa a serem comidas. Mas a essa altura já não havia mais ninguém para ouvir seus gritos. 
 
 
Nas Noites Árabes - uma caravana de histórias - Tahir Shah - Editora Roça Nova - pág. 325 - 327 - Rio de Janeiro, 2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Médico na Escola
Dr José Carlos Machado
www.mediconaescola.com

Acompanhe tampem nosso canal no You Tube! https://www.youtube.com/user/medicinaescolar