TETRO
EUA/Itália/Espanha/Argentina, 2009 – 127 minutos
Vincent Gallo, Alden Ehrenreich, Klaus Maria
Brandauer, Maribel Verdú, Carmen Maura.
Direção – Francis Ford Copolla
Podemos
esquecer quem somos e de onde viemos? Mesmo tentando, por que o passado insiste
em retornar e, na maioria das vezes quando o faz, vem acompanhado de velhas
feridas? As questões familiares, sobretudo na relação do pai com os filhos é o
tema central desse filme de Copolla após duas décadas sem filmar.
A
rivalidade entre pai e filho surge na figura tirânica de Carlo Tetroncini, o
maestro narcisista interpretado por Klaus Maria Brandauer, que disputa com
primogênito a conquista de uma jovem com um desfecho infeliz, também a trágica
morte de sua mãe e as relações familiares já desgastadas fazem com que o filho
mais velho, Ângelo vá se refugiar em Buenos Aires, trabalhando como iluminador
de peças de teatro. Na tentativa de esquecer o passado, muda de nome,
aparentemente tentando se re-inventar. Curiosamente adota o nome de Tetro, uma
alusão ao nome de família (Tetroncini), talvez na esperança de re-escrever a
própria história não se afasta do nome original, salientando com isso, que
temos de um modo ou de outro, a se ater com as nossas questões, que sobrevoam,
mas que, insistentemente, teimam em nos importunar, ou como diria Guimarães
Rosa: “a gente vive, é mesmo para se desiludir e desmisturar” (in, Grande
Sertão Veredas); a grande dificuldade talvez seja mesmo “sair dessa mistura”,
sem perder a sua própria identidade. Esse viés delicado é evocado na
conflitante relação do pai com o filho, que aparecem nas lembranças propositalmente
coloridas, contrastando com o presente monótono e monocromático
Desse
modo surge em sua vida reclusa, seu meio irmão Bennie, que vai ao encontro do
primogênito cobrando dele a promessa feita de que um dia voltaria para
resgatá-lo do ambiente familiar, mas que nunca cumpriu. A presença desse
encontro interfere em sua rotina de escritor fracassado e recluso que vive ao
lado de sua mulher Miranda. A visita inesperada e indesejada faz com que Tetro
se torne mais amargurado ainda querendo que o irmão e tudo o que ele evoca
saiam o mais rapidamente possível de sua vida, mas sua mulher se enternece por
Bennie revelando aquilo que conhece sobre Ângelo, inclusive colocando-o em
contato com o livro que o marido jamais publicou e que revela muito de seu
passado.
Os
personagens masculinos, Carlo, Ângelo e Bennie evidenciam em suas relações a
demarcação da função simbólica do pai, naquilo que diz respeito à existência de
uma parcela do Pai real, que determina uma das bases mais fundamentais da
clínica psicanalítica; partindo da edificação do pai simbólico a partir do pai
real se constrói toda a dinâmica da discussão edipiana e suas conseqüências
psíquicas que passam então a surgir, os filhos buscam essa baliza e a figura
desse pai simbólico e tirânico paira sobre eles convocando esse enfrentamento.
Após
muito tempo sem filmar, Copolla volta à cena em um belo filme em preto e
branco, filmado no bairro La Boca e na Patagônia argentina com belíssimas
imagens, onde as cores surgem nas reminiscências dos personagens. A trilha
sonora é um capítulo a parte, Sapatinhos Vermelhos da obra Os Contos de
Hoffmann, na versão de Jacques Offenbach, surge através de uma bela coreografia
nas lembranças do personagem ao se recordar de sua mãe que era cantora lírica.
José Carlos Neves Machado.
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Dr José Carlos Machado
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