MEU
FILHO NÃO TEM AMIGOS.
ECO, responda bem certo.
Meus amigos me amarão?
E o ECO me responde: sim!
Mário de Andrade.
Amizade é um amor que nunca morre.
Rubem Alves.
Meu filho não brinca com outras crianças!
Minha filha não brinca com as coleguinhas e quando insistimos ela chora e diz
que não quer ir mais na escola! Fica muito tempo sozinho e não chama ninguém
para brincar, quando “forçamos” ele chora e quer ir para casa! Relatos comuns e
os pais não sabem como agir.
E se perguntam: - Seria timidez ou algo mais
sério? - Filhos únicos tem maior dificuldade de entrosamento do que crianças
que tem mais irmãos? - Temperamentos mais introvertidos preferem ficar sós? – O
que eu posso fazer para ele mudar?
Pais e professores que lidam com crianças
introvertidas que preferem o isolamento ficam preocupados com esse tipo de
atitude e querem ajuda-las a serem mais sociáveis e extrovertidas.
Cada vez mais os núcleos familiares se
encontram diminuídos. Muitos casais tem um ou dois filhos. Nos grandes centros
as famílias se isolam em apartamentos ou condomínios. O contato com os primos e
primas, vizinhos que frequentam áreas comuns são cada vez mais raros. Às vezes
esses encontros acontecem, mas, sendo muito esporádico, falta intimidade, essa
ausência de proximidade não ajuda muito no manejo necessário dos
relacionamentos. Para que isso aconteça naturalmente também precisa de treino,
de repetição.
Por sua vez, pais tímidos costumam defender a
quietude de seus filhos e não se importam tanto com o isolamento deles, pois se
identificam com essa característica, recordam como eram quando crianças, sendo
muitas vezes incompreendidos e se solidarizam. Por outro lado, aqueles mais
expansivos não admitem que seus filhos, ao contrário deles mesmos, prefiram
permanecer sozinhos ao invés da companhia de outras pessoas e fazem tudo o que
podem para que as crianças se modifiquem, interajam mais e sejam mais sociáveis.
Classificam como um grave defeito o fato da criança preferir ficar só.
Antes de classificar a criança quieta como
sendo portadora de algum sério distúrbio comportamental convém observá-la com
cuidado. Como ela se comporta em ambientes desconhecidos: observa e depois
consegue interagir ou permanece na defensiva durante todo o tempo? Na escola,
por exemplo, demorou muito para fazer a adaptação, interage somente com os
adultos, principalmente com a professora? Chora o tempo todo? Tem muita
dificuldade em lidar com os limites? Não brinca com nenhuma criança ou agride
(algumas mordem) quando são confrontadas?
Essas considerações importam quando, honestamente podemos observar a criança, e procurar entende-la antes de julgá-la e classifica-la. A criança pode ser apenas diferente daquilo que esperaríamos que fosse. Simplesmente carimba-la de insociável, introvertida, tímida ou muito quieta não parece ajudar muito. Embora o isolamento social seja algo a ser considerado, vale também considerar outras opções.
Carl Jung (1875 – 1961) em seu livro, Tipos
Psicológicos, refere que: “introvertidas são atraídas pelo mundo interior do
pensamento, extrovertidos pela vida externa de pessoas e atividades; introvertidos
focam no significado que tiram dos eventos ao seu redor; extrovertidos mergulham
nos próprios acontecimentos”. Atualmente, introversão e extroversão são
dois dos aspectos mais pesquisados na psicologia da personalidade.
A sociedade diz que para sermos bem-sucedidos
temos de ser ousados e nos posicionarmos; que para sermos felizes, temos de ser
sociáveis. Almejamos ser uma nação de extrovertidos, sorridentes e sociáveis e
talvez isso possa significar que perdemos de vista aquilo que realmente somos.
Como os quietos e os introvertidos poderão viver nesse mundo falante e
expansivo?
A escritora Susan Horowitz Cain, descreve os
percalços em educar crianças quietas em um mundo que não consegue ouvi-las: “Uma
das melhores coisas que se você pode fazer por uma criança introvertida é
trabalhar com ela em suas reações a novidades. Lembrem-se que introvertidos não
reagem apenas a novas pessoas, mas também a novos lugares e acontecimentos.
Então não confunda a reserva de seu filho diante de situações novas com
incapacidade de se relacionar com os outros. Ele está recuando diante da
novidade ou da superestimulação, não diante do contato humano.” (*).
Portanto, nem sempre os quietos e reservados
devem ser rotulados como “esquisitos”, talvez sejam introvertidos e
precisem de ajuda para participarem no mundo onde a cobrança por desempenho e
extroversão são um passaporte social mais aceitável e acessível.
Também vale lembrar que pessoas introvertidas
não são necessariamente tímidas. Timidez é o medo da desaprovação social e da
humilhação inserida nessa premissa, enquanto a introversão é a preferência por
ambientes que não sejam estimulantes demais. A timidez pode ser inerentemente
dolorosa, a introversão, não.
O sociólogo e filósofo Zygmunt Bauman (1925 –
2017), que desenvolveu uma teoria para explicar o modo de vida na sociedade
contemporânea dizia que: “hoje, o medo da exposição foi abafado pela alegria
de ser notado”. Portanto, vivendo em “tempos líquidos”, como ele
também classifica nossa época, aqueles que preferem não serem notados,
simplesmente não aparecem.
Os pais podem promover alguns encontros com
seus filhos, desde que não o exponham demais. De preferência em sua própria
casa, pois é um espaço conhecido onde a criança se sentirá mais segura. Nesse
encontro também deverá ter alguns ajustes: a criança precisa concordar em
receber o amigo em casa e muitas vezes será mais curto do que o previsto;
dependendo da companhia, crianças mais reservadas não interagem inicialmente
com aquelas mais efusivas, talvez dois quietos consigam “falar a mesma
língua”; não adianta promover esses encontros e deixar que as crianças
fiquem na frente da televisão; atividades ao ar livre ou mesmo jogos e
brincadeiras não competitivas podem ajudar a que as crianças experimentem sair
de seus casulos. O importante é que a criança perceba que ela pode ser
diferente, ficar quieta, preferir brincar sozinha e tudo estará certo. Se os
adultos conduzirem de forma cuidadosa e sem ansiedade ela possa encontrar o seu
próprio jeito de se expressar. Como é difícil para os introvertidos avaliarem
os seus próprios talentos e o quanto é magnífico e significativo quando
finalmente conseguem.
Existe um ensinamento
búdico que ensina que: “Nossa vida é nossa oportunidade”. Como
pais e condutores percebemos que as crianças, às vezes, são muito parecidas
conosco, o que pode ser bom ou talvez temerário, principalmente se temos dificuldade
em nos aceitar como somos. Justamente nessa constatação temos a oportunidade de
mudar. Aqueles que sofreram em sua vida sendo taxados de tímidos e sem
expressão, ficam compadecidos quando identificam esse padrão em seu filho e
podem ajuda-lo, não querendo modifica-lo, mas podendo dizer que o entende,
porque já passou por isso também e esse pertencimento e aceitação faz toda a
diferença. Por outro lado, alguns identificam em seus filhos exatamente o
contrário do que consideram satisfatório e, mesmo sem querer, os rejeitam por
não corresponderem às suas expectativas, às vezes, se trata de uma “má combinação
entre pais e filho” e para que isso se transforme é importante que os pais
aceitem e ajudem os filhos que tem. Experimentando uma recombinação.
Fernando Pessoa nos propõe algo simples e profundo ao dizer que: “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”
(*) O PODER DOS QUIETOS –
Como os tímidos e introvertidos podem mudar um mundo que não para de falar –
Susan Cain – [tradução de Ana Carolina Bento Ribeiro] – Rio de Janeiro: Agir,
2012 – pag. 248.
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Médico na Escola
Dr José Carlos Machado
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