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Dr José Carlos Neves Machado, médico pediatra, especialista em Antroposofia.
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quinta-feira, 17 de novembro de 2022
AROMA, PALADAR E SAÚDE - resenha de livro
segunda-feira, 14 de novembro de 2022
DE PUERIS - resenha de livro
De Pueris
(Dos Meninos) / A Civilidade Pueril
Erasmo de Rotterdam
tradução, introdução e notas de Luiz Feracini
editora Escala, segunda edição, texto integral, 2008
187 páginas
Erasmo de Rotterdam, conhecido pela sátira da sociedade européia do século XVI (Elogia da Loucura, em 1511), escreveu essa obra em 1530 e a pergunta que se faz é se valeria a pena a leitura de um curso de filosofia da educação escrito no século XVI nos dias atuais?
Então, talvez através dos assuntos abordados em vários capítulos, pode-se constatar como a observação desses temas ainda são tão pertinentes em nossa época atual.
O autor defende que "o homem não nasce acabado e, sim, incompleto. Ele só se aperfeiçoa pela educação". e complementa que "o homem não nasce homem, mas torna-se homem". E é através da educação, do processo educativo, cujo objetivo principal é tornar o homem perfeito. Esse pensador humanista e atual vale a pena ser descoberto, justamente pela sua atualidade.
"Que uso e proveito em tantos bens se aquele a quem tudo se destina, não sabe como administrá-los?" e também " Não se pode galardoar o filho com prendas inacessíveis, mas podes instruí-lo nas artes mediante as quais coisas excelentes podem ser alcançadas" (no capítulo Nunca é cedo demais para iniciar o processo educacional). Enfim, não continua existindo senão as mesmas perguntas, mas ainda as mesmas angústias frente à educação de nossos filhos?
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HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA E DA FAMÍLIA - resenha de livro
HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA E DA FAMÍLIA
PHILIPPE ARIÈS
tradução de Dora Flaksman
LTC, segunda edição, 2019
196 páginas
O autor, Philippe Ariès (1914 - 1984), historiador e pesquisador aborda como os problemas da vida cotidiana se colocam diante de todos nós e nos impactam e nos transformam, seu foco é a metade do século XX e apresenta as mudanças de comportamento na história social da família através do tempo.
"Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. è difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo.", refere o autor (A descoberta da infância).
Para quem gosta de história e tem interesse em descobrir particularidades que foram se transformando através do tempo é uma leitura obrigatória. O nascimento e o desenvolvimento desse sentimento de família desde o século XV até o século XVIII vai evoluindo com a mudança dos costumes e podemos então constatar que não foi o individualismo que triunfou, foi a família.
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O VIOLINO CIGANO - resenha de livro
O VIOLINO CIGANO
e outros contos de mulheres sábias.
Regina Machado
ilustrações de Joubert
Companhia das Letras / Seguinte - São Paulo, 2017.
130 páginas
"Das três filhas de um viúvo rico, apenas a mais nova, Leila, é flor que se cheire. As insuportáveis Dronha e Catina, além de invejarem a beleza e a simpatia da caçula, só poderão arranjar casamento quando está tiver se casado primeiro. E eis que a inveja e a raiva acabam levando Dronha a empurrar sua irmãzinha em um precipício. Não há testemunhas. O sumiço da garota permanece um triste mistério para todos. Mas Leila voltará à vida na forma de um violino mágico e nas mãos de um jovem pastor irá espalhar, com sua música, antigas verdades que por muito tempo ficaram ocultas."
Essa é uma das belas histórias que a autora, contadora de histórias e escritora Regina Machado, apresenta nesse livro recheado de contos da cultura cigana, irlandesa, árabe, persa, indiana, chinesa e até brasileira (O papagaio real), com heroínas e mulheres sábias que nos inspiram e encantam.
Todas com narrativas que transmitem um certo tipo de conhecimento e que nos ajudam a compreender os caminhos do desenvolvimento do ser humano. Através das analogias que esses contos apresentam os personagens não são simplesmente pessoas, mas arquétipos que expressam qualidades e possibilidades humanas de desenvolvimento que a razão não explica, mas que a nossa intuição percebe e captura, pois pode então entrar em contato com tudo aquilo que essas narrativas nos despertam.
Essa é a grande riqueza que os contos podem suscitar e que Regina Machado reconta nesse livro em 17 histórias de encantamento, ensinamento e sabedoria para serem apreciadas, ouvidas e relidas muitas vezes e como diz Fatima personagem de um belíssimo conto grego (Fátima, a fiandeira): "tudo aquilo que aconteceu na minha vida, contribuiu, na realidade, para minha felicidade final". Os contos trazem essa possibilidade.
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sábado, 12 de novembro de 2022
FUNDAMENTOS DA ANTROPOSOFIA APLICADA À SAÚDE - resenha de livro
sexta-feira, 11 de novembro de 2022
NÓS E A ESCOLA - resenha de livro
A ESCOLA COM QUE SEMPRE SONHEI SEM IMAGINAR QUE PUDESSE EXISTIR - resenha de livro
TRABALHAR FORA DE CASA E O QUE FAZER COM AS CRIANÇAS? - artigo
TRABALHAR FORA DE CASA, AS CRIANÇAS FICAM COM QUEM?
Quando o importante fica sufocado pelo urgente, o
tempo para consertar tal distúrbio é muito maior do que aquele que se usaria
antes dele existir.
Mário Sergio Cortella.
Talvez
em um mundo ideal a criança pudesse usufruir da presença de sua mãe o tempo
todo até completar seis, sete anos. Então ela ficaria em casa e a partir daí iria
para a escola para aprender a ler e escrever. Mas a realidade não é bem assim.
Se por um lado essa situação pode ser favorável à criança, embora com ressalvas,
sob outro aspecto, impraticável e inviável para muitas mães. Isso envolve
vários fatores: questões financeiras, conjugais e também demandas ligadas à
realização profissional feminina e pessoal e por que isso deveria ser
irrelevante? A responsabilidade geralmente fica por conta da mãe. A sociedade e,
inclusive a própria mulher cobra de si mesma um cuidado e uma dedicação particular
ao filho somado à culpa que ela mesma alimenta, por pretender voltar a
trabalhar ou ser obrigada a deixar seu filho sem os seus cuidados exclusivos.
Parafraseando um autor que trabalhou muito a
relação mãe-filho, o pediatra e psicanalista inglês Donald Winnicott (1896 –
1971), que dizia que uma “mãe
suficientemente boa” já faz o bastante (1).
Muitas
vezes em atendimento recomendo que algumas mulheres retornem logo ao seu ritmo
de trabalho, simplesmente porque acabam deixando a criança mais neurótica, não
por intenção, evidentemente, mas inconscientemente essa relação acaba ficando
simbiótica além do previsto, sufocando-a com uma quantidade exagerada de
cuidados e preocupações comprometendo a relação que ao invés de prazerosa se
transforma em uma interação doentia. Não dá para ser mãe 24 horas por dia, essa
atuação desenfreada vai sair caro para a mulher, para a criança também haverá
prejuízos. É necessária que alguma coisa seja feita para contribuir para romper
essa simbiose e o retorno às atividades da mãe pode ser esse elemento curativo.
As
mães geralmente se sentem cansadas, desvalorizadas, injustiçadas com o papel social
imposto de que a responsabilidade de cuidar e educar sejam tão ou somente delas.
Precisam atender as demandas ininterruptas de suas crias, postergando desejos e
projetos para mais tarde ou, simplesmente ignora-los por completo; muitas abrem
mão de tudo pelos filhos e outras tantas se conformam com isso. Ônus da
maternidade?
Correm
o risco de repetir um velho chavão, talvez ouvido por elas de suas próprias
mães quando eram crianças, um modelo conhecido, porém equivocado que dizia: “dediquei
os melhores anos da minha vida aos meus filhos” ou ainda “abri mão de
tudo por eles” e isso, caso realmente vier à tona e for direcionado aos
seus filhos poderão receber uma resposta indelicada, ingrata, embora verdadeira:
“eu não pedi nada disso, você fez porque quis!” Pois bem, precisamos
assumir as consequências das nossas escolhas e caso optarmos por outras
alternativas não é justo compartilhar esse prejuízo com os outros,
especialmente os filhos.
Crianças
pequenas realmente necessitam de muitos cuidados e atenção, é uma tarefa que
precisa e deve ser compartilhada pelo casal, portanto, exceto em situações onde
essa possibilidade não existe, essa divisão nos cuidados com a prole deve garantir
que pelo menos essa carga não recaia exclusivamente sobre a mãe.
Alguns
planos realmente precisam ser adiados, transformados, reprogramados talvez,
quando o casal compartilha a tarefa de educar e cuidar de seu filho em comum
acordo, o desenvolvimento parental cresce e individualmente os dois
experimentam a satisfação de que entre erros e acertos, os esforços
direcionados à criança possibilitam que se transforme em uma pessoa capaz de
enfrentar seus próprios desafios, pois teve a oportunidade de conhecer pais
bons o bastante que permitiram sua
autonomia e independência.
O
psicanalista Bruno Bettelheim (1903 – 1990) adaptando o conceito de Winnicott
sobre esse viés comenta: “para se criar bem um filho, não devemos tentar ser
um pai perfeito, assim como não devemos esperar que nosso filho seja, ou venha
a ser, um indivíduo perfeito. A perfeição não está ao alcance do comum dos
seres humanos. Os esforços para atingi-la entram tipicamente em choque com a
indulgência com que devemos responder às imperfeições dos outros, inclusive as
de nosso próprio filho, único elemento capaz de tornar boas as relações humanas
possíveis. É provável, no entanto, que nos tornemos um pai bastante bom – isto
é, um pai que cria bem seu filho. Para realizar isso, os equívocos que cometemos
na criação de nosso filho – erros muitas vezes feitos em virtude da intensidade
de nosso envolvimento emocional com ele – devem ser mais do que compensados
pelas muitas instâncias nas quais agimos acertadamente em relação a ele”. (2)
Mesmo
quando a criança rejeita a mãe, quando esta vai ao seu encontro depois de um
dia de trabalho, não significa que o filho a ame menos, mas sim que não
suportou a sua ausência e expressa essa raiva dela rejeitando-a. Já presenciei
muitas cenas que as mães realmente sofrem com esse desprezo e até se deixam
intimidar pelas atitudes grosseiras de seus filhos que as repelem com
agressividade, quando talvez a conduta mais adequada fosse aproveitar essa
situação e esperar até que essa raiva se dissipe e a criança reconheça a mãe
amorosa que voltou.
Não cabem explicações e desculpas: - Mamãe
teve de trabalhar para ganhar dinheiro! Ou ainda: - Olha que presente lindo que
eu trouxe pra você! Em uma disfarçada justificativa de que a criança a perdoe
por ela ter de fazer aquilo que ela precisava ter feito e que fará também no
dia seguinte.
A
postura é o maior alicerce que se pode oferecer e para a criança basta a
confiança, se a mãe lhe diz: - Mamãe vai trabalhar e depois eu volto! E
realmente ela voltará, isso é o suficiente. Excesso de justificativas,
desculpas e explicações não ajudam em nada e só servem como uma dissimulação
para diminuir a culpa. Afinal, que tanta culpa é essa que muitas mulheres
carregam dentro de si, por precisarem se afastar um pouco de suas crias, para
trabalhar fora de casa? Comparativamente essa mesma situação raramente afeta os
homens.
Nesse
pacote da culpa somam-se algumas coisas que devem ser questionadas, por
exemplo, nos casais em que existe a figura do pai, caso este não se ofereça, recomendo
que seja convocado pela mãe o mais rapidamente possível. Atualmente essa
parceria vem acontecendo naturalmente, o que é muito saudável, mas o padrão
machista ainda é comum. Nesses casos, costumo perguntar para alguns pais/homens
se esperam receber pelo correio uma carta de convocação, um pedido solene para
assumir seu filho ou consideram que essa não seria uma tarefa adequada,
pertinente ao sexo masculino? Pode ser engraçado, mas muitos parecem mesmo aguardar
um pedido semelhante, não se manifestam espontaneamente, somente por uma
demanda externa. Isso é um erro, não se deveria esperar que as coisas desabassem
para se tomar uma providência e as mulheres certamente agradecerão muito essa
iniciativa que deveria a princípio, ser feita naturalmente, mas caso isso não
aconteça as mães devem solicitar, ou melhor, convocar essa participação, isso faz
muito bem para o casal. E é bom que fique claro: o filho e as responsabilidades
inerentes, são de competência do casal.
Não
é justo que durante o dia a mãe cumpra o seu papel zeloso e contínuo e à noite
essa tarefa continue sendo sua responsabilidade. Esse plantão noturno pode e
deve ser também uma tarefa compartilhada com o pai da criança. Para tanto tem
de haver dedicação e compromisso verdadeiro, não adianta a criança chorar à
noite e ao atende-la a boa vontade do pai termine rapidamente reconvocando a
presença da mãe com a desculpa de que “a única que pode fazer com que a
criança se acalme e pare de chorar é a mãe”; afinal se o filho é de ambos,
esses momentos também precisam ser divididos. Ao atender à criança, o pai poderia
responder: - Eu estou aqui! E essa postura deveria bastar para tranquiliza-la.
Se isso não surtir efeito das primeiras vezes convém insistir e treinar.
Entendo
e sei, por experiência própria, que nem sempre é assim que acontece, mas
realmente funciona melhor quando essa atitude é verdadeira e quando o pai se
esforça e toma para si a tarefa de coeducar o filho do casal, que é o seu filho
também, até durante a noite, mesmo atrapalhando seu sono. Isso também faz
parte.
A
mãe precisa abrir mão desse poder centralizador, por mais que em alguns casos
duvide dos talentos do marido em relação aos cuidados com seu filho. Precisa e
deve “passar a bola” ao companheiro que terá sua chance e ao seu modo se
aventure livremente nessa tarefa de cuidar da criança, afinal quem além da mãe
seria a pessoa mais adequada do que o próprio pai para aquietar a criança?
Diferente no manejo, menos participativo no cotidiano, inexperiente e talvez
até inábil, mas adequadíssimo para a função de cuidar do filho. Com treino e
persistência mesmo os mais desajeitados dos pais aprendem as tarefas mais
simples e assumem junto com as mães os cuidados com seus filhos. Essa função é
do casal, não se pode transferir tampouco adia-la. Criar uma criança precisa de
tempo, paciência, dedicação, vontade, coragem também, mas sobretudo amor.
Desse
modo, nessa retomada da vida e dos projetos do casal, onde ambos: homem e mulher,
tem assegurado o seu próprio desenvolvimento individual e agora também
familiar, podem contar um com o outro na criação do seu filho.
A
possibilidade de escolher um lugar adequado para a criança ficar enquanto os
pais trabalham passa a ser uma tarefa compartilhada. A sensação de abandono, o
remorso de deixar a criança pequena na creche, podem também ser divididos pelos
pais, que dividem essa escolha e assim se estruturam e repartem a tarefa que
decisões desse tipo costumam trazer. Melhor dividir por dois ao invés de apenas
um assumir a responsabilidade, tendo em mente que o filho é de ambos.
Sobre
a importância das primeiras experiências que a criança recebe de seus pais, o
psicanalista Bruno Bettelheim ensina: “outra indicação de que uma criança ter
sido bem criada é sua capacidade de enfrentar razoavelmente as infindáveis
vicissitudes, as muitas agruras e as sérias dificuldades que, muito
provavelmente, encontrará pela frente e fazer isso sobretudo porque se sente
seguro. Embora nem sempre livre de dúvidas sobre si mesmo”.
(1) OS BEBÊS E SUAS MÃES / Donald Woods Winnicott – [tradução
de Jefferson Luiz Camargo] - São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1988.
(2) UMA VIDA PARA SEU FILHO
– Pais bons o bastante / Ajude o seu filho a ser a pessoa que ele deseja –
BRUNO BETTELHEIM [tradução de Maura Sardinha e Maria Helena Geordane] – décima
oitava edição – Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1989.
BRINCADEIRA DE CRIANÇA - artigo
A CRIANÇA E SEU BRINCAR
O ser humano só brinca
quando é um ser humano no sentido pleno da palavra e é plenamente ser humano
quando brinca. Schiller.
Estimular a criança pequena com brinquedos
educativos ajuda em seu desenvolvimento? Essa é uma dúvida comum de muitos pais
preocupados com os produtos que chegam às mãos de seus filhos.
A
primeira coisa que precisa ficar clara: - O que é um brinquedo educativo? Ou
talvez: - Existem brinquedos educativos? Tenho observado que a imensa maioria
dos chamados brinquedos “educativos”, são, na verdade, propaganda enganosa,
o fato de existir uma recomendação que aquele tipo de brinquedo é aconselhável
para crianças de determinada idade, não é garantia suficiente de que seja
adequado. A imensa maioria emite algum tipo de som, mesmo muitos daqueles
feitos de madeira, com alegada proposta natural, talvez menos excitantes,
embora tragam tantos elementos estimulantes que fico procurando como associar a
palavra “educativo” em algo tão excitante e antinatural.
Na
verdade, a criança gosta de brincar, de descobrir as coisas, crianças pequenas
se encantam mais com os embrulhos (e abri-los é uma grande brincadeira para
elas) do que propriamente com os seus conteúdos.
Comento com os pais que os pequenos se
divertem mais com o som que fazem com panelas e colheres de pau do que os
carrinhos eletrônicos, bonecas falantes ou os monstros e super-heróis que
ganham de presente.
Segundo
a médica Emmi Pikler (1902 – 1984) comentando a respeito da intervenção dos
adultos diante das iniciativas da criança descobrindo as coisas à sua volta: “É
crucial que a criança descubra por si mesma tanto quanto possível. Se a
ajudamos a finalizar cada tarefa, a estamos privando do mais importante aspecto
do seu desenvolvimento. Uma criança que consegue as coisas por meio da
experimentação independente adquire um tipo de conhecimento completamente
diferente daquela criança para qual são oferecidas soluções prontas”.
Objetos
com poucos estímulos artificiais deveriam ser privilegiados. Logicamente que a
criança é um excelente consumidor e a indústria e a publicidade voltados para
isso já perceberam esse público, nesse caso se justifica investir em um “trambolho”
para a criança com especificações técnicas atraentes: possui rodinhas e
direção, permitindo sua locomoção, cores vibrantes e ainda dispõe de vários
tipos de som. Importante que na etiqueta diz que não tem material tóxico, é
recomendada para determinada faixa etária, possui selo e certificação. Isso é
suficiente para motivar o pai investir nesse tipo de “brinquedo educativo”
que pode até interessar a criança por algum tempo, mas que rapidamente será
mais uma peça cara e inútil que ocupará espaço e arrependimento de quem o
comprou. A pergunta anterior a ser feita
seria: - Esse tipo de coisa é interessante para a criança, isso realmente vale
a pena, qual a vantagem? Exceto a referência narcísica ao dizer: - Meu filho
tem aquele brinquedo que buzina, tem rodinhas, parece um foguete, recomendado
para sua idade e custou muito caro! Perceber qual a utilidade para a criança desse
tipo de aquisição pouparia menos arrependimentos futuros.
Quando
a criança começa a descobrir o mundo à sua volta quer explorá-lo e
experimentá-lo, então os pais devem observar que a casa que antes era somente
de adultos agora comporta também uma pessoa curiosa, que vai querer enfiar o
dedo na tomada, que vai pôr a mão no cinzeiro, que vai colocar o dedo no
ventilador, então alguns cuidados precisam ser tomados e algumas coisas
retiradas de seu alcance. Aquele bibelô lindo de vidro que a mãe comprou quando
foi em uma viagem com o marido e que ela adora, deveria ser protegido das
mãozinhas velozes dos pequenos exploradores, porque a pergunta que fica é a
seguinte: - Caso essa peça se quebre a mãe vai entender ou vai brigar com a
criança que nem sabe seu valor? A exploração por esse mundo ainda desconhecido precisa
ser observada e não refreada, pois essa autonomia da criança acontece
naturalmente e deve ser estimulada.
O
mundo da criança agora é a sua casa, então também deve ser verificada com
atenção, pois, quando as crianças começam a explorá-la descobrem coisas
interessantes e perigosas (tesouras, produtos de limpeza, isqueiros, canetas,
objetos de vidro, cortantes ou pontiagudos, comida de cachorro e tudo que ficar
próximo de suas mãozinhas rápidas e espertas), nesse caso como gostam de
experimentar, levam as coisas à boca e, portanto, convém ficar atentos,
evitando acidentes.
Conheço
casas onde o lugar da criança brincar e onde ficam seus brinquedos é a própria
casa, ou seja: tudo! A criança domina todo o espaço. Nesses casos ela talvez
tenha dificuldade de organizar seus brinquedos, que ficam espalhados pela casa
toda e, em consequência disso, nem consegue brincar com todos eles e ainda não
distingue onde é o seu espaço, porque não tem limite físico para isso. O que
adianta o menino ter cinquenta carrinhos se ele não dá conta de brincar com
todos eles, a menina que tem um monte de bonecas, nem consegue lembrar o nome
de todas. Não seria o caso de evitar oferecer outro carrinho, ou evitar comprar
mais uma boneca?
Muitos
pais oferecem para a criança aquilo que não tiveram quando pequenos e desse
modo tentam compensar alguma falta que sentiram quando pequenos e preenchem
essa lacuna através da criança, quando de fato, esses presentes são oferecidos
para eles próprios.
Às
vezes, como mencionei anteriormente, coisas simples adquirem um significado
absolutamente maior que o excesso, nem a sofisticação não preenchem. Assim como
também não colabora em nada os aparelhos eletrônicos, os smartphones e os
tabletes que as crianças ganham de presente e que começam a fazer parte de suas
vidas já desde muito cedo. A pretexto de serem estimulantes ou de oferecer
joguinhos e brincadeiras que “toda criança adora”, são placidamente
aceitos e fazem parte do mundo infantil substituindo a criatividade por
estagnação, não contribuem em nada na descoberta da criança, ao contrário,
provocam um reducionismo muito grande, pois trazem elementos excitatórios pelos
quais a criança fica literalmente capturada (leia mais no capítulo A criança e
o Mundo Virtual).
É importante se questionar a esse respeito,
refletir e ter consciência da introdução desse tipo de “brinquedo” na vida da
criança. Quais as vantagens e as desvantagens? Alegar simplesmente que hoje
isso é normal pode parecer um argumento muito simplório, ou ficar passivo
diante dessa aquisição que foi oferecida pela avó, ou pela madrinha, quando falta
a força ou a coragem dos pais para amenizar ou impedir isso, as crianças ficam
sem a proteção daqueles que deveriam protege-las.
O
grande engano que considero é achar que todos esses elementos: monstros,
super-heróis, excesso de brinquedos e jogos eletrônicos são inócuos,
acreditando que a manipulação pelas crianças não interfere em nada, que não trará
consequências desagradáveis. Pois bem, infelizmente a má notícia é: trazem
muitos problemas sim! Mais do que gostaríamos. Porque começam a fazer parte da
vida infantil de maneira intensa. O “Homem Aranha”, por exemplo, que a
criança ganhou de presente chega até ela com todo o seu repertório e sua imagem
fica impressa em sua memória, passa a conviver com ela, às vezes ainda sobra
espaço para a fantasia, outras não, justamente porque esses personagens já tem
uma história pronta, um enredo e como foram elaborados para outro público, fica
no mínimo incongruente que faça parte do universo infantil tão precocemente.
Não
podemos deixar de pensar a respeito dessas aquisições e com maturidade decidir
o que é adequado para nossas crianças, mais uma vez o crivo deve ser dos pais.
Não se pode agir com indiferença porque haverá consequências dessa
displicência.
Quando
pequenas as crianças descobrem e se encantam com o ambiente à sua volta. Colocando
em suas mãos algum brinquedo, equivale a sugestão para que brinque e quanto
mais complicada for essa brincadeira, mais dependente de nós ela será. Essa
atitude é tão comum nos adultos que talvez isso passe completamente
despercebido pela maioria de nós. É intuitivo, porém pouco produtivo no aspecto
da autonomia, que façamos as coisas pela criança. Seja pelo pretexto de auxílio
ou de participação, geralmente os adultos “atravessam” esse limiar de
descoberta que a criança necessita explorar através de seus próprios meios
(leia mais no capítulo sobre Autonomia e Independência: Imprescindíveis!).
Nada
mais decepcionante do que colocar nas mãozinhas do bebê um chocalho quando, na
verdade, o grande prazer é a descoberta de seu próprio corpo. Muitos berços tem
tantas “geringonças penduradas” e brinquedos espalhados, que estimulam
demais e que alteram até a proposta desse local, que foi feito para descansar e
dormir. Outro erro comum, esse com maiores consequências ainda, seria privar a
criança de andar sozinha oferecendo andadores para facilitar essa conquista,
interferindo não somente no andar, mas ainda na fala e na sequência também em
seu pensamento. (1)
Ambientes
apropriados para as crianças brincarem não precisam ser repletos de estímulos.
Para estimular o potencial criativo podemos oferecer objetos de diferentes
formas, tamanhos, cores, volumes, texturas, onde a criança pode explorar de
forma curiosa e livremente exercitar sua motricidade, habilidades e autonomia.
Quando respeitamos cada etapa do desenvolvimento infantil não impondo regras ou
restrições, estamos de fato ajudando-a a ser livre e autossuficiente.
A
criança pequena gosta de jogar a bola e recebe-la de volta, com esse gesto
simples revela o prazer e a diversão da repetição, estimulando sua autonomia e
movimento livre. Quando nos escondemos e de repente surgimos diante dela
provocando uma gargalhada gostosa, estamos estimulando a criança a brincadeiras
que trazem conforto e alegria que não se compara com o estímulo de bonecos de
plástico ou bichinhos de pelúcia.
Crianças
pequenas precisam ficar próximas, requerem a observação atenta dos adultos que,
não precisam estimulá-las o tempo todo, mas, identificar suas aptidões deixando-as
livres para descobrirem seu espaço.
Podemos
observar que crianças que rapidamente se entediam de brincarem sozinhas
necessitando da presença de um adulto por perto, reforça o sentimento de sua
dependência, desse modo suas experimentações ficarão reduzidas àquelas que o
adulto irá propor. Não tem curiosidade de explorar novos objetos e seu brincar
é monótono, repetitivo e pouco criativo.
Muitos pais conseguem conciliar suas
atividades domésticas e profissionais ao lado de seus pequenos filhos, quando
conseguem essa proeza e atendê-los, com paciência e amorosidade, as coisas
costumam dar certo, acontece que as crianças também percebem quando esse nível
de atenção tem ou não qualidade, ou seja, crianças requerem tempo, dedicação e
paciência para não apressar o seu desenvolvimento que é absolutamente
individual.
A
criança precisa sentir essa disponibilidade do adulto que, antes de qualquer
coisa, elege a prioridade de ficar com ela, abrindo mão de alguns afazeres,
desse modo a criança vai confiando no adulto que está ao seu lado e aos poucos ganhando
autonomia e independência podemos deixa-la mais distante, não significa
abandoná-la, estimulando sua independência, então essa segurança vai sendo
construída e se fortalecendo cada vez mais.
Geralmente
incentivo os pais a cantarem, músicas infantis que ouviam quando eram crianças.
São revestidas de afeto, com um sotaque amoroso e acalentador, isso faz toda
diferença, a criança brinca ouvindo uma voz humana conhecida e que interage com
ela. Os adultos também poderão dispor de algum tempo para lhe dar atenção, observando
a atividade em que a criança se encontra envolvida, não fazendo por ela, nem
estimulando-a
Desaprendemos
a praticar coisas simples, como cantar ou assobiar enquanto estamos realizando
nossas tarefas diárias ou não reclamar quando precisamos fazer outras coisas, talvez
não tão agradáveis, mas que precisam ser feitas. Não devemos esquecer que as
crianças nos observam com atenção e imitam nossos gestos e palavras, portanto,
convém ficarmos atentos.
A
médica húngara Emmi Pikler comentou a respeito do brincar infantil: “Recentemente
tem ocorrido grandes discussões sobre se deixar uma criança brincar
demasiadamente de forma livre poderia prejudicar seu desenvolvimento. Nós temos
um ponto de vista oposto, o brincar livre, independente, sem ajuda ou incitação
de quem a cuida (que no âmbito familiar significa sem a presença dos pais) é
fundamental para o desenvolvimento. Porém isso só funciona se proporcionamos
continuamente os elementos condutores externos e se a criança está ativa e
ocupada, inclusive sem a presença do adulto. É um esforço considerável dar à
criança a liberdade e a quietude que requer esse tipo de brincadeira dentro de
um grupo de crianças. Pensamos que o esforço vale a pena.” (2)
A
infância passa rapidamente e precisamos aproveitá-la da melhor forma possível.
(1)
ANDAR, FALAR,
PENSAR / A ATIVIDADE LÚDICA / Rudolf Steiner [tradução de Jacira Cardoso] –
nona edição – São Paulo: Ed. Antroposófica, 2014
(2)
AS ORIGENS DO
BRINCAR LIVRE / Éva Kálló/Györgyi Balog – [tradução Susana Martínez] – São
Paulo: Omnisciência, 2017. (Coleção primeira infância: educar de 0 a 6 anos)
ATÉ QUANDO VAI O ALEITAMENTO MATERNO? - artigo
DESMAME, UMA DECISÃO DIFÍCIL DE TOMAR.
É impossível
progredir sem mudança e aqueles que não mudam suas mentes não podem nada mudar.
George Bernard Shaw.
Qual a idade
certa para desmamar a criança? Essa é uma pergunta que geralmente me
fazem e a transfiro para as mães, pois, cabe somente a elas essa resposta,
justamente, porque essa decisão passa além do prazer em amamentar o seu filho,
não necessariamente pela questão nutricional, mas pelo contato, pelo desejo de
adiar um pouco ainda essa interação particular, justamente porque além de prazeroso
é bom, único e absolutamente pessoal, esse é um vínculo exclusivo entre a mãe e
a criança. Portanto, idade certa é muito relativo. Às vezes esse tempo se
prolonga e a substituição por outro tipo de comida, leite artificial ou até
sólidos, também é postergada e quem dá essa permissão, quem autoriza essa
mudança, inquestionavelmente, é novamente a mãe, mas esse assunto também pode e deveria ser compartilhado, pois é uma escolha que implicará em muitas consequências, nem todas fáceis.
Alguns
bebês rejeitam o seio materno e mesmo com a insistência das mães recusam esse
oferecimento e a solução é oferecer leite artificial e utilizam-se as
mamadeiras, porém a maioria prefere o leite materno e a introdução de novos
alimentos, mesmo de maneira gradativa, também precisa do consentimento materno
ou de, pelo menos, de seu incentivo nessa substituição. De uma maneira geral o
leite materno preenche todas as necessidades da criança nos primeiros meses de
vida, no começo sob uma livre demanda (quando a criança quer o seio é
prontamente oferecido), mas logo após os primeiros trinta, quarenta dias esse
ritmo já pode ser regulado pela mãe que percebe que existe um tempo biológico
regular (por exemplo, de 3 em 3 horas) entre a digestão do leite ingerido e as
mamas ficarem novamente cheias de leite, desse modo se estabelece uma sincronia
e a mãe começa a voltar gradativamente à sua rotina, porque o bebê incorporou
esse horário das mamadas e ela já entende quando o choro anunciado é de fome ou
outra coisa. E assim as coisas caminham até os seis, sete meses, com o rodízio
dos seios, quinze a vinte minutos em cada seio, a aquisição do sono tranquilo e
o desenvolvimento do bebê vai indo muito bem, obrigado; tirando uma cólica ou
outra, uma reação pós vacinal, erupção dentária, trata-se de um período
tranquilo dentro de casa. Pelo menos é o que a teoria e os manuais de
aleitamento materno ensinam e esse processo caminha até os dois anos de idade.
Logicamente
que nem sempre é assim, principalmente quando o ritmo das mamadas não acontece
e o aleitamento demora muito tempo, a criança não dorme, chora o dia todo,
troca o dia pela noite e mãe vira um “zumbi” contentando-se com a hora
que o bebê dorme para poder dar um cochilo rápido.
Aparência,
leitura além das direcionadas ao bebê, cuidados pessoais, sono tranquilo, outras
coisas que saiam desse circuito – mãe-bebê – simplesmente não cabem mais. Quem
já não ouviu esse relato de alguma mãe? E o pior, aquelas que passaram por algo
semelhante podem acrescentar ainda mais infortúnios, porque depois de certo
tempo essa situação aparenta não ter fim, em alguns casos a criança recusa
outro tipo de alimento e só fica quieta ao seio materno. O problema parece
aumentar quando esse hábito acaba se incorporando na vida da criança que
cresce, mas não se desenvolve, seu ritmo de sono fica irregular, o
desenvolvimento pondero-estatural fica comprometido e quanto à mãe...bem, essa
criatura além de dar conta dessa tarefa tem que se haver com uma série de
cobranças: - Interromper a mamada porquê, se o leite materno faz tão bem? –
Tirar o leite materno, justo agora que a criança não aceita mais nada? Quando indecisas, a voz corrente vem em seu
auxílio: – Enquanto tiver leite e a criança quiser a mãe deve oferecer! E o
receio: - Essa interrupção no aleitamento pode gerar algum trauma no
desenvolvimento do meu filho?
Acende
um alerta dentro da cabeça da mãe que diz: - Meu filho não pode passar fome!
Então elencado a isso surgem várias explicações: “o leite materno faz bem!”; “a
criança deve mamar até os dois anos de idade”; “minha mãe me contou que eu
mesma mamei até bem tarde”. Difícil remar contra uma maré tão forte.
Essas
questões são válidas e completamente pertinentes e sempre que as ouço
proferidas por desespero ou por ansiedade materna, tento me colocar no lugar
dessas mulheres, que precisam decidir sozinhas esse dilema, às vezes
enlouquecedor e terrivelmente solitário.
Evidente
que o aleitamento é um maravilhoso ato de amor, um vínculo bastante forte, mas
não é a única e absoluta opção. Acredito, justamente por acompanhar essa
transição, que essa decisão também pode e deve ser repartida com o pai da criança,
porque envolve a família como um todo.
A criança que mama o seio materno e continua
solicitando-o ininterruptamente, sem ritmo e sem horário, nos faz pensar em
duas situações: 1. Pouca quantidade de leite materno produzido pela mãe (talvez
por exaustão dela própria, que não consegue relaxar e não dá tempo para
produzir um volume adequado); 2. O aleitamento é fornecido sem intervalos e
funciona como uma espécie de compensação diante das manifestações de
desconforto (incômodos nem sempre associados a fome, mas a criança se acostuma
e se tranquiliza com o seio na boca).
O problema é que essas situações não se
resolvem facilmente, a resolução provisória ganha um propósito e se transforma
em definitiva, porque essas atitudes vão sendo incorporadas e a criança aprende
que chorando ela consegue mamar, ou rejeitam novas opções alimentares porque
sabem que receberam o seio materno, insatisfatório para um adequado suporte
calórico-nutricional, enfim esse ciclo se fecha de uma maneira até que
satisfatória para a criança, mas muito desfavorável para a mãe e em quase a sua
totalidade permanece sozinha, na decisão e durante o processo de desmame. Isso
é coisa de mãe! Como dizem alguns e que muitas mães acreditam piamente nisso,
como uma espécie de ônus pelo qual elas devem passar, afinal coisas da
maternidade, diriam alguns.
Nesse
cenário temos dois personagens importantes que se encontram em quase total
simbiose: mãe/seio – filho. Enquanto as coisas se ajeitarem e ambos estiverem
confortáveis a vida segue seu curso, mas, quando esse arranjo desequilibra por
algum motivo, como os citados anteriormente ou outros tantos que surgem na vida
familiar, outros personagens deverão ser convocados e o primeiro que se chama é
o pai da criança.
Mas
onde ele está? Em situações onde a mãe encontra-se sozinha, vai lá que esse
apoio não aconteça, deve-se contar com aquilo que se tem e essa tarefa se torna
bem mais difícil, mas quando ele está próximo (o que não quer dizer,
necessariamente presente), por que não o convidar para participar? Esse é um
questionamento importante que precisa ser feito.
Sob
o ponto de vista fisiológico o nascimento dos dentes pressupõe e indica que o
corpo passa a ter novos elementos, cuja função básica é de receber novos
alimentos, começa um processo de transformação no aparelho digestivo que continua
começando na boca, agora com o auxílio dos dentes, o PH bucal se modifica, a
quantidade de saliva também aumenta e se transforma, conforme a aquisição de
novos ingredientes em seu cardápio. A criança pode ser estimulada a mastigar os
alimentos ao invés de somente suga-los, o metabolismo se encontra mais
amadurecido e a criança pode aceitar perfeitamente outras opções nutritivas,
com parcimônia e critério, logicamente. Não significa abolir completamente o
leite materno, apenas pensar na possibilidade em que esse não venha a ser o
único alimento disponível para a criança se alimentar.
Quando
o intervalo entre as mamadas vai ficando cada vez mais curto, avaliar se as
necessidades alimentares dessas crianças são preenchidas somente com o leite
materno, que embora seja excelente, após algum tempo já não preenche todas as
necessidades e deixa de ser exclusivo, sem prejuízo para a criança.
Mostrar
à mãe que tem esse tipo de angústia em relação ao desmame, orientando outras
possibilidades complementares com introdução de novas opções pode servir de um
grande alento e diminuir a ansiedade que muitas mulheres tem em relação ao
aleitamento por livre demanda (até quando a criança quiser).
Então,
resumidamente, cada caso é um caso. Necessariamente o aleitamento exclusivo até
os seis meses não é obrigatoriamente um consenso entre os pediatras e todas as
técnicas de amamentação previsíveis não são unanimes, existem as exceções,
existem outras possibilidades mais confortáveis às mães que, podem e merecem
ter um ritmo de vida mais tranquilo e equilibrado, mesmo continuando a
amamentar seu filho, mas não se escravizando a essa única função. Isso tudo tem
a ver com o desmame, pois envolve uma subjetividade que se camufla no desejo da
mãe de querer o melhor para seu filho e também controla-lo, mas que também quer
e precisa dormir, tomar um banho em paz, poder contar com alguém cuidando do
filho enquanto faz outra coisa, em razão disso é que, entre outras coisas, oriento
a “convocação” paterna. A palavra é exatamente essa, esse chamamento deve ser
imperativo por parte da mãe, aqui não se trata de uma concessão, de uma ajuda, de
um “quebra-galho”, mas de uma participação efetiva, de um compromisso,
com a prioridade do momento de vida do casal, ou seja, compartilhar os cuidados
com o filho deles.
Muitos
pais (infelizmente) acreditam que essa empreitada é feminina e nessa espécie de
desinteresse velado, podem se justificar dizendo: - Não sei o que fazer quando
o bebê chora! – Não tenho leite de peito! - Quando começa a chorar só fica
quieto quando está mamando no peito da mãe! O que pode até explicar o
comodismo, mas não colabora com a transformação necessária para esse nó
desenrolar.
De
outro modo cabe também esclarecer que existe um grande movimento em torno do
estímulo ao aleitamento materno o qual, de modo algum merece qualquer contestação,
a questão que fica é em torno do oferecimento, ou seja, qual o ritmo dessas
mamadas? Livre demanda? Nesse caso o
bebê (e até as crianças acima de dois anos), é que terão o domínio da refeição?
Com o risco de que desse modo nem sempre, se observa um resultado satisfatório,
seja do ponto de vista nutricional (com a monotonia alimentar e a quase que
exclusividade pelo leite materno) e também em seu desenvolvimento psíquico,
porque a autonomia saudável fica substituída por uma simbiose muito intensa e,
caso venha a se tornar um hábito, sua interrupção adiada será muito brusca com
prejuízos para a dupla mãe e filho.
O
desmame, assim como outros processos de ruptura não são fáceis, quando pensamos
no desenvolvimento infantil esse será apenas um deles. Outros percalços já
aconteceram anteriormente: quando o bebê nasceu e saiu da barriga da mãe com
todas as suas consequências, assaduras, cólicas, erupção dos dentes, etc. Daqui
para frente outros cortes também deverão acontecer: a retirada das fraldas, a
autonomia de andar sozinho, dormir em seu próprio quarto, introdução de
sólidos, o controle dos esfíncteres e, finalmente o momento da criança sair de
casa e ir para outro ambiente, geralmente a escola, onde passará uma boa parte
de sua vida.
Cortes precisam ser feitos, o desmame, a retirada do seio materno é uma decisão difícil e cuidadosa, mas não pode ser adiada além da conta, um dia tem que parar, quando a mãe decide isso esse desmame acontece, com apoio e menos cobrança fica mais fácil.
ISOLAMENTO SOCIAL, INTROVERSÃO OU TIMIDEZ - A CRIANÇA SOLITÁRIA - artigo
MEU
FILHO NÃO TEM AMIGOS.
ECO, responda bem certo.
Meus amigos me amarão?
E o ECO me responde: sim!
Mário de Andrade.
Amizade é um amor que nunca morre.
Rubem Alves.
Meu filho não brinca com outras crianças!
Minha filha não brinca com as coleguinhas e quando insistimos ela chora e diz
que não quer ir mais na escola! Fica muito tempo sozinho e não chama ninguém
para brincar, quando “forçamos” ele chora e quer ir para casa! Relatos comuns e
os pais não sabem como agir.
E se perguntam: - Seria timidez ou algo mais
sério? - Filhos únicos tem maior dificuldade de entrosamento do que crianças
que tem mais irmãos? - Temperamentos mais introvertidos preferem ficar sós? – O
que eu posso fazer para ele mudar?
Pais e professores que lidam com crianças
introvertidas que preferem o isolamento ficam preocupados com esse tipo de
atitude e querem ajuda-las a serem mais sociáveis e extrovertidas.
Cada vez mais os núcleos familiares se
encontram diminuídos. Muitos casais tem um ou dois filhos. Nos grandes centros
as famílias se isolam em apartamentos ou condomínios. O contato com os primos e
primas, vizinhos que frequentam áreas comuns são cada vez mais raros. Às vezes
esses encontros acontecem, mas, sendo muito esporádico, falta intimidade, essa
ausência de proximidade não ajuda muito no manejo necessário dos
relacionamentos. Para que isso aconteça naturalmente também precisa de treino,
de repetição.
Por sua vez, pais tímidos costumam defender a
quietude de seus filhos e não se importam tanto com o isolamento deles, pois se
identificam com essa característica, recordam como eram quando crianças, sendo
muitas vezes incompreendidos e se solidarizam. Por outro lado, aqueles mais
expansivos não admitem que seus filhos, ao contrário deles mesmos, prefiram
permanecer sozinhos ao invés da companhia de outras pessoas e fazem tudo o que
podem para que as crianças se modifiquem, interajam mais e sejam mais sociáveis.
Classificam como um grave defeito o fato da criança preferir ficar só.
Antes de classificar a criança quieta como
sendo portadora de algum sério distúrbio comportamental convém observá-la com
cuidado. Como ela se comporta em ambientes desconhecidos: observa e depois
consegue interagir ou permanece na defensiva durante todo o tempo? Na escola,
por exemplo, demorou muito para fazer a adaptação, interage somente com os
adultos, principalmente com a professora? Chora o tempo todo? Tem muita
dificuldade em lidar com os limites? Não brinca com nenhuma criança ou agride
(algumas mordem) quando são confrontadas?
Essas considerações importam quando, honestamente podemos observar a criança, e procurar entende-la antes de julgá-la e classifica-la. A criança pode ser apenas diferente daquilo que esperaríamos que fosse. Simplesmente carimba-la de insociável, introvertida, tímida ou muito quieta não parece ajudar muito. Embora o isolamento social seja algo a ser considerado, vale também considerar outras opções.
Carl Jung (1875 – 1961) em seu livro, Tipos
Psicológicos, refere que: “introvertidas são atraídas pelo mundo interior do
pensamento, extrovertidos pela vida externa de pessoas e atividades; introvertidos
focam no significado que tiram dos eventos ao seu redor; extrovertidos mergulham
nos próprios acontecimentos”. Atualmente, introversão e extroversão são
dois dos aspectos mais pesquisados na psicologia da personalidade.
A sociedade diz que para sermos bem-sucedidos
temos de ser ousados e nos posicionarmos; que para sermos felizes, temos de ser
sociáveis. Almejamos ser uma nação de extrovertidos, sorridentes e sociáveis e
talvez isso possa significar que perdemos de vista aquilo que realmente somos.
Como os quietos e os introvertidos poderão viver nesse mundo falante e
expansivo?
A escritora Susan Horowitz Cain, descreve os
percalços em educar crianças quietas em um mundo que não consegue ouvi-las: “Uma
das melhores coisas que se você pode fazer por uma criança introvertida é
trabalhar com ela em suas reações a novidades. Lembrem-se que introvertidos não
reagem apenas a novas pessoas, mas também a novos lugares e acontecimentos.
Então não confunda a reserva de seu filho diante de situações novas com
incapacidade de se relacionar com os outros. Ele está recuando diante da
novidade ou da superestimulação, não diante do contato humano.” (*).
Portanto, nem sempre os quietos e reservados
devem ser rotulados como “esquisitos”, talvez sejam introvertidos e
precisem de ajuda para participarem no mundo onde a cobrança por desempenho e
extroversão são um passaporte social mais aceitável e acessível.
Também vale lembrar que pessoas introvertidas
não são necessariamente tímidas. Timidez é o medo da desaprovação social e da
humilhação inserida nessa premissa, enquanto a introversão é a preferência por
ambientes que não sejam estimulantes demais. A timidez pode ser inerentemente
dolorosa, a introversão, não.
O sociólogo e filósofo Zygmunt Bauman (1925 –
2017), que desenvolveu uma teoria para explicar o modo de vida na sociedade
contemporânea dizia que: “hoje, o medo da exposição foi abafado pela alegria
de ser notado”. Portanto, vivendo em “tempos líquidos”, como ele
também classifica nossa época, aqueles que preferem não serem notados,
simplesmente não aparecem.
Os pais podem promover alguns encontros com
seus filhos, desde que não o exponham demais. De preferência em sua própria
casa, pois é um espaço conhecido onde a criança se sentirá mais segura. Nesse
encontro também deverá ter alguns ajustes: a criança precisa concordar em
receber o amigo em casa e muitas vezes será mais curto do que o previsto;
dependendo da companhia, crianças mais reservadas não interagem inicialmente
com aquelas mais efusivas, talvez dois quietos consigam “falar a mesma
língua”; não adianta promover esses encontros e deixar que as crianças
fiquem na frente da televisão; atividades ao ar livre ou mesmo jogos e
brincadeiras não competitivas podem ajudar a que as crianças experimentem sair
de seus casulos. O importante é que a criança perceba que ela pode ser
diferente, ficar quieta, preferir brincar sozinha e tudo estará certo. Se os
adultos conduzirem de forma cuidadosa e sem ansiedade ela possa encontrar o seu
próprio jeito de se expressar. Como é difícil para os introvertidos avaliarem
os seus próprios talentos e o quanto é magnífico e significativo quando
finalmente conseguem.
Existe um ensinamento
búdico que ensina que: “Nossa vida é nossa oportunidade”. Como
pais e condutores percebemos que as crianças, às vezes, são muito parecidas
conosco, o que pode ser bom ou talvez temerário, principalmente se temos dificuldade
em nos aceitar como somos. Justamente nessa constatação temos a oportunidade de
mudar. Aqueles que sofreram em sua vida sendo taxados de tímidos e sem
expressão, ficam compadecidos quando identificam esse padrão em seu filho e
podem ajuda-lo, não querendo modifica-lo, mas podendo dizer que o entende,
porque já passou por isso também e esse pertencimento e aceitação faz toda a
diferença. Por outro lado, alguns identificam em seus filhos exatamente o
contrário do que consideram satisfatório e, mesmo sem querer, os rejeitam por
não corresponderem às suas expectativas, às vezes, se trata de uma “má combinação
entre pais e filho” e para que isso se transforme é importante que os pais
aceitem e ajudem os filhos que tem. Experimentando uma recombinação.
Fernando Pessoa nos propõe algo simples e profundo ao dizer que: “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”
(*) O PODER DOS QUIETOS –
Como os tímidos e introvertidos podem mudar um mundo que não para de falar –
Susan Cain – [tradução de Ana Carolina Bento Ribeiro] – Rio de Janeiro: Agir,
2012 – pag. 248.
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