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quinta-feira, 17 de novembro de 2022

AROMA, PALADAR E SAÚDE - resenha de livro




AROMA, PALADAE E SAÚDE
orientações, receitas e cardápios da culinária antroposófica
Maria Lúcia Bruno
editora Antroposófica, São Paulo
1992
135 páginas

A nutricionista propõe a saúde física e espiritual através de orientações, receitas baseadas na culinária 
antroposófica e diz "o que torna um alimento verdadeiramente nutritivo para o homem são suas forças aromáticas cósmicas, que lhe permitem criar o substrato material da consciência."
Não é necessário ter uma ligação direta com a Antroposofia para experimentar as delícias que Maria Lúcia ensina nas páginas desse livro baseando-se no conceito de desenvolvimento humano através do aproveitamento das qualidades intrínsecas de cada alimento, no papel que cada ingrediente representa no prato ou no cardápio, visando o equilíbrio e qualidade necessários. Trata-se de harmonizar e experimentar como os diversos alimentos podem potencializar e equilibrar não somente o organismo físico, mas também a vitalidade, a saúde mental e espiritual da pessoa.
Rudolf Steiner dizia que "não é tão significativo o que a pessoa come, mas o que irá fazer com aquilo que come"
Sem dogmas, modismos alimentares ou simples práticas alternativas, o objetivo principal é oferecer pratos deliciosos, recheados de sabor e vitalidade; nesse caso além da alimentação ser simplesmente funcional pode tornar-se uma ferramenta terapêutica e muito saborosa também.
Bom apetite!

MOLHO DE MEL E HORTELÃ PARA SALADAS

(rendimento - 2 porções individuais)
ingredientes:
Mel ------------------------------------ 02 colheres das de sopa
Vinagre de maça --------------------- 04 colheres das de sopa
Azeite de oliva ----------------------- 03 colheres das de sopa
Hortelã fresca picada ---------------- 01 colher das de sopa
Água filtrada -------------------------  01 colher das de sopa
modo de prepar:
Misture bem todos os ingredientes, colocando sal se achar necessário; prepare o molho próximo a hora de servir e agite bem antes de usar.


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segunda-feira, 14 de novembro de 2022

DE PUERIS - resenha de livro




De Pueris

(Dos Meninos) / A Civilidade Pueril

Erasmo de Rotterdam

tradução, introdução e notas de Luiz Feracini

editora Escala, segunda edição,  texto integral, 2008

187 páginas


Erasmo de Rotterdam, conhecido pela sátira da sociedade européia do século XVI (Elogia da Loucura, em 1511), escreveu essa obra em 1530 e a pergunta que se faz é se valeria a pena a leitura de um curso de filosofia da educação escrito no século XVI nos dias atuais?

Então, talvez através dos assuntos abordados em vários capítulos, pode-se constatar como a observação desses temas ainda são tão pertinentes em nossa época atual.

O autor defende que "o homem não nasce acabado e, sim, incompleto. Ele só se aperfeiçoa pela educação". e complementa que "o homem não nasce homem, mas torna-se homem". E é através da educação, do processo educativo, cujo objetivo principal é tornar o homem perfeito. Esse pensador humanista e atual vale a pena ser descoberto, justamente pela sua atualidade.

"Que uso e proveito em tantos bens  se aquele a quem tudo se destina, não sabe como administrá-los?"  e também " Não se pode galardoar o filho com prendas inacessíveis, mas podes instruí-lo nas artes mediante as quais coisas excelentes podem ser alcançadas" (no capítulo Nunca é cedo demais para iniciar o processo educacional). Enfim, não continua  existindo senão as mesmas perguntas, mas ainda as mesmas angústias frente à educação de nossos filhos?


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HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA E DA FAMÍLIA - resenha de livro




HISTÓRIA SOCIAL DA CRIANÇA E DA FAMÍLIA

PHILIPPE ARIÈS

tradução de Dora Flaksman

LTC, segunda edição, 2019

196 páginas

O autor, Philippe Ariès (1914 - 1984), historiador e pesquisador aborda como os problemas da vida cotidiana se colocam diante de todos nós e nos impactam e nos transformam, seu foco é a metade do século XX e apresenta as mudanças de comportamento na história social da família através do tempo.

"Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. è difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo.", refere o autor (A descoberta da infância).

Para quem gosta de história e tem interesse em descobrir particularidades que foram se transformando através do tempo é uma leitura obrigatória. O nascimento e o desenvolvimento desse sentimento de família desde o século XV até o século XVIII vai evoluindo com a mudança dos costumes e podemos então constatar que não foi o individualismo que triunfou, foi a família.


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O VIOLINO CIGANO - resenha de livro



O VIOLINO CIGANO

e outros contos de mulheres sábias.

Regina Machado

ilustrações de Joubert

Companhia das Letras / Seguinte - São Paulo, 2017.

130 páginas

"Das três filhas de um viúvo rico, apenas a mais nova, Leila, é flor que se cheire. As insuportáveis Dronha e Catina, além de invejarem a beleza e a simpatia da caçula, só poderão arranjar casamento quando está tiver se casado primeiro. E eis que a inveja e a raiva acabam levando Dronha a empurrar sua irmãzinha em um precipício. Não há testemunhas. O sumiço da garota permanece um triste mistério para todos. Mas Leila voltará à vida na forma de um violino mágico e nas mãos de um jovem pastor irá espalhar, com sua música, antigas verdades que por muito tempo ficaram ocultas."

Essa é uma das belas histórias que a autora, contadora de histórias e escritora Regina Machado, apresenta nesse livro recheado de contos da cultura cigana, irlandesa, árabe, persa, indiana, chinesa e até brasileira (O papagaio real), com heroínas e mulheres sábias que nos inspiram e encantam.

 Todas com narrativas que transmitem um certo tipo de conhecimento e que nos ajudam a compreender os caminhos do desenvolvimento do ser humano. Através das analogias que esses contos apresentam os personagens não são simplesmente pessoas, mas arquétipos que expressam qualidades e possibilidades humanas de desenvolvimento que a razão não explica, mas que a nossa intuição percebe e captura, pois pode então entrar em contato com tudo aquilo que essas narrativas nos despertam. 

Essa é a grande riqueza que os contos podem suscitar e que Regina Machado reconta nesse livro em 17 histórias de encantamento, ensinamento e sabedoria para serem apreciadas, ouvidas e relidas muitas vezes e como diz Fatima personagem de um belíssimo conto grego (Fátima, a fiandeira): "tudo aquilo que aconteceu na minha vida, contribuiu, na realidade, para minha felicidade final". Os contos trazem essa possibilidade. 


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sábado, 12 de novembro de 2022

FUNDAMENTOS DA ANTROPOSOFIA APLICADA À SAÚDE - resenha de livro





FUNDAMENTOS DA ANTROPOSOFIA APLICADA À SAÚDE
Nilo Gardin e colaboradores
editora Liber Vitae
2021
651 páginas

Nilo Gardin teve a preocupação de abordar vários temas sob o olhar da Antroposofia e para isso convidou vários colegas com expertise em assuntos diversos, o que confere dinamismo e abrangência com a devida profundidade.
Então nos vários capítulos temos a possibilidade de entender o que o especialista tem a dizer, por exemplo, sobre A historia da Antroposofia aplicada á saúde (Bruno Callegaro), As fases da vida (Ronaldo Perlatto) e Medicina Escolar (José Carlos Machado).
Uma obra que traz os principais temas da Antroposofia  na saúde e se aplica tanto ao leitor que jamais estudou essa vertente e deseja iniciar seus conhecimentos nessa área, como também que já familiarizado com o assunto e almeja seu aprofundamento.
Um excelente material destinado aos profissionais de saúde, pacientes, terapeutas, professores e leitores em geral.





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sexta-feira, 11 de novembro de 2022

NÓS E A ESCOLA - resenha de livro





NÓS E A ESCOLA 
Agonias e Alegrias
Mário Sergio Cortella
Editora Vozes, Petrópolis
2018
50 páginas

São mais de quarenta anos de magistério em que o professor Cortella reflete entre "agonias e alegrias" suas "pensatas pedagógicas" (44 apresentadas nesse livro), como ele mesmo prefere definir suas reflexões repletas de leveza, erudição e conhecimento de causa. 
O autor fica completamente à vontade em seu ambiente escolar, traz questionamentos (as tais agonias...) quando aborda os temas: Docência, a que será que se destina? Ou  quando conclui: Somos todos amadores, entre outras tantas pensatas, mas também parece se divertir quando tenta explicar "Como voar fora de casa" ou no capítulo "Descansar não é vadiagem" (seriam essas as alegrias?). 
A leitura de seus livros (outros já comentados nesse Blog) trazem ao leitor um panorama embasado e em absoluto bom senso e com uma lógica simples e viável, quando diz, citando seu grande mestre Paulo Freire que "a finalidade da Educação é proteger e manter a vida" e mais adiante conclui que "quando fazemos uma lista das razões pelas quais somos docentes, a coluna dos "apesar de..." não pode ficar maior do que a dos "por causa de..."



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A ESCOLA COM QUE SEMPRE SONHEI SEM IMAGINAR QUE PUDESSE EXISTIR - resenha de livro





A ESCOLA QUE SEMPRE SONHEI SEM IMAGINAR QUE PUDESSE EXISTIR
Rubem Alves
Papirus Editora
décima terceira edição
2019
122 páginas

O prefácio desse livro é de Ademar Ferreira dos Santos que nos apresenta a Escola da Ponte, cuja pedagogia é considerada por muitos uma comunidade educativa, revolucionária em procurar a democracia no sentido de que todos os seus membros concorram para formação de uma vontade e de um saber coletivos  e autorregulada, pois as regras e normas se baseiam em agir  e interagir de uma determinada maneira, de acordo com uma ideia coletivamente apropriada e compartilhada por todos e o objetivo comum é constituir um ambiente amigável e solidário de aprendizagem. Tarefa difícil, mas que encantou uma pessoa voltada para as questões pedagógicas saudáveis e vivas como Rubem Alves.
Na Escola da Ponte, ensina o mestre: "As crianças que sabem ensinam as crianças que não sabem. Isso não é exceção. É a rotina do dia a dia. A aprendizagem e o ensino são um empreendimento comunitário, uma expressão de solidariedade. Mais que aprender saberes, as crianças estão aprendendo valores. A ética perpassa silenciosamente, sem explicações, as relações naquela sala imensa. Na outra parede encontrei dois quadros de avisos. Num deles estava afixada a frase: "Tenho necessidade de ajuda em...". E, no outro, a frase: "Posso ajudar em...". Qualquer criança que esteja tendo dificuldade em qualquer assunto coloca ali o assunto em que está tendo dificuldades e o seu nome. Um outro colega, vendo o pedido, vai ajudá-la. E qualquer criança que se ache em condições de ajudar em algum assunto coloca ali o assunto em que se julga competente e o seu nome. Assim vai se formando uma rede de relações de ajuda".
É ou não algo revolucionário, na melhor definição da palavra? Um espaço único partilhado por todos, sem separação por turmas, sem campainhas anunciando o fim das aulas e com uma lição social compartilhada por todos: Todos partilhamos de um mesmo mundo! Não há competição, todos se ajudam e há cooperação. A vida social depende de que cada um abra mão de sua própria vontade principalmente se isso for contrário à vontade coletiva. Saber que um modelo pedagógico como esse (idealizado na década de 1970 por José Pacheco em Portugal) existe e é possível de ser realizado revela como diz o nome desse livro algo sempre sonhado e até então inimaginável.
Uma leitura importante para quem trabalha com educação e deseja entender e saber mais sobre outras propostas pedagógicas.





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TRABALHAR FORA DE CASA E O QUE FAZER COM AS CRIANÇAS? - artigo






TRABALHAR FORA DE CASA, AS CRIANÇAS FICAM COM QUEM?

Quando o importante fica sufocado pelo urgente, o tempo para consertar tal distúrbio é muito maior do que aquele que se usaria antes dele existir.

Mário Sergio Cortella.

Talvez em um mundo ideal a criança pudesse usufruir da presença de sua mãe o tempo todo até completar seis, sete anos. Então ela ficaria em casa e a partir daí iria para a escola para aprender a ler e escrever. Mas a realidade não é bem assim. Se por um lado essa situação pode ser favorável à criança, embora com ressalvas, sob outro aspecto, impraticável e inviável para muitas mães. Isso envolve vários fatores: questões financeiras, conjugais e também demandas ligadas à realização profissional feminina e pessoal e por que isso deveria ser irrelevante? A responsabilidade geralmente fica por conta da mãe. A sociedade e, inclusive a própria mulher cobra de si mesma um cuidado e uma dedicação particular ao filho somado à culpa que ela mesma alimenta, por pretender voltar a trabalhar ou ser obrigada a deixar seu filho sem os seus cuidados exclusivos.

  Parafraseando um autor que trabalhou muito a relação mãe-filho, o pediatra e psicanalista inglês Donald Winnicott (1896 – 1971), que dizia que uma “mãe suficientemente boa” já faz o bastante (1).

Muitas vezes em atendimento recomendo que algumas mulheres retornem logo ao seu ritmo de trabalho, simplesmente porque acabam deixando a criança mais neurótica, não por intenção, evidentemente, mas inconscientemente essa relação acaba ficando simbiótica além do previsto, sufocando-a com uma quantidade exagerada de cuidados e preocupações comprometendo a relação que ao invés de prazerosa se transforma em uma interação doentia. Não dá para ser mãe 24 horas por dia, essa atuação desenfreada vai sair caro para a mulher, para a criança também haverá prejuízos. É necessária que alguma coisa seja feita para contribuir para romper essa simbiose e o retorno às atividades da mãe pode ser esse elemento curativo.

As mães geralmente se sentem cansadas, desvalorizadas, injustiçadas com o papel social imposto de que a responsabilidade de cuidar e educar sejam tão ou somente delas. Precisam atender as demandas ininterruptas de suas crias, postergando desejos e projetos para mais tarde ou, simplesmente ignora-los por completo; muitas abrem mão de tudo pelos filhos e outras tantas se conformam com isso. Ônus da maternidade?

Correm o risco de repetir um velho chavão, talvez ouvido por elas de suas próprias mães quando eram crianças, um modelo conhecido, porém equivocado que dizia: “dediquei os melhores anos da minha vida aos meus filhos” ou ainda “abri mão de tudo por eles” e isso, caso realmente vier à tona e for direcionado aos seus filhos poderão receber uma resposta indelicada, ingrata, embora verdadeira: “eu não pedi nada disso, você fez porque quis!” Pois bem, precisamos assumir as consequências das nossas escolhas e caso optarmos por outras alternativas não é justo compartilhar esse prejuízo com os outros, especialmente os filhos.

Crianças pequenas realmente necessitam de muitos cuidados e atenção, é uma tarefa que precisa e deve ser compartilhada pelo casal, portanto, exceto em situações onde essa possibilidade não existe, essa divisão nos cuidados com a prole deve garantir que pelo menos essa carga não recaia exclusivamente sobre a mãe.

Alguns planos realmente precisam ser adiados, transformados, reprogramados talvez, quando o casal compartilha a tarefa de educar e cuidar de seu filho em comum acordo, o desenvolvimento parental cresce e individualmente os dois experimentam a satisfação de que entre erros e acertos, os esforços direcionados à criança possibilitam que se transforme em uma pessoa capaz de enfrentar seus próprios desafios, pois teve a oportunidade de conhecer pais bons o bastante que  permitiram sua autonomia e independência.  

O psicanalista Bruno Bettelheim (1903 – 1990) adaptando o conceito de Winnicott sobre esse viés comenta: “para se criar bem um filho, não devemos tentar ser um pai perfeito, assim como não devemos esperar que nosso filho seja, ou venha a ser, um indivíduo perfeito. A perfeição não está ao alcance do comum dos seres humanos. Os esforços para atingi-la entram tipicamente em choque com a indulgência com que devemos responder às imperfeições dos outros, inclusive as de nosso próprio filho, único elemento capaz de tornar boas as relações humanas possíveis. É provável, no entanto, que nos tornemos um pai bastante bom – isto é, um pai que cria bem seu filho. Para realizar isso, os equívocos que cometemos na criação de nosso filho – erros muitas vezes feitos em virtude da intensidade de nosso envolvimento emocional com ele – devem ser mais do que compensados pelas muitas instâncias nas quais agimos acertadamente em relação a ele”. (2)

Mesmo quando a criança rejeita a mãe, quando esta vai ao seu encontro depois de um dia de trabalho, não significa que o filho a ame menos, mas sim que não suportou a sua ausência e expressa essa raiva dela rejeitando-a. Já presenciei muitas cenas que as mães realmente sofrem com esse desprezo e até se deixam intimidar pelas atitudes grosseiras de seus filhos que as repelem com agressividade, quando talvez a conduta mais adequada fosse aproveitar essa situação e esperar até que essa raiva se dissipe e a criança reconheça a mãe amorosa que voltou.

 Não cabem explicações e desculpas: - Mamãe teve de trabalhar para ganhar dinheiro! Ou ainda: - Olha que presente lindo que eu trouxe pra você! Em uma disfarçada justificativa de que a criança a perdoe por ela ter de fazer aquilo que ela precisava ter feito e que fará também no dia seguinte.

A postura é o maior alicerce que se pode oferecer e para a criança basta a confiança, se a mãe lhe diz: - Mamãe vai trabalhar e depois eu volto! E realmente ela voltará, isso é o suficiente. Excesso de justificativas, desculpas e explicações não ajudam em nada e só servem como uma dissimulação para diminuir a culpa. Afinal, que tanta culpa é essa que muitas mulheres carregam dentro de si, por precisarem se afastar um pouco de suas crias, para trabalhar fora de casa? Comparativamente essa mesma situação raramente afeta os homens.

Nesse pacote da culpa somam-se algumas coisas que devem ser questionadas, por exemplo, nos casais em que existe a figura do pai, caso este não se ofereça, recomendo que seja convocado pela mãe o mais rapidamente possível. Atualmente essa parceria vem acontecendo naturalmente, o que é muito saudável, mas o padrão machista ainda é comum. Nesses casos, costumo perguntar para alguns pais/homens se esperam receber pelo correio uma carta de convocação, um pedido solene para assumir seu filho ou consideram que essa não seria uma tarefa adequada, pertinente ao sexo masculino? Pode ser engraçado, mas muitos parecem mesmo aguardar um pedido semelhante, não se manifestam espontaneamente, somente por uma demanda externa. Isso é um erro, não se deveria esperar que as coisas desabassem para se tomar uma providência e as mulheres certamente agradecerão muito essa iniciativa que deveria a princípio, ser feita naturalmente, mas caso isso não aconteça as mães devem solicitar, ou melhor, convocar essa participação, isso faz muito bem para o casal. E é bom que fique claro: o filho e as responsabilidades inerentes, são de competência do casal.

Não é justo que durante o dia a mãe cumpra o seu papel zeloso e contínuo e à noite essa tarefa continue sendo sua responsabilidade. Esse plantão noturno pode e deve ser também uma tarefa compartilhada com o pai da criança. Para tanto tem de haver dedicação e compromisso verdadeiro, não adianta a criança chorar à noite e ao atende-la a boa vontade do pai termine rapidamente reconvocando a presença da mãe com a desculpa de que “a única que pode fazer com que a criança se acalme e pare de chorar é a mãe”; afinal se o filho é de ambos, esses momentos também precisam ser divididos. Ao atender à criança, o pai poderia responder: - Eu estou aqui! E essa postura deveria bastar para tranquiliza-la. Se isso não surtir efeito das primeiras vezes convém insistir e treinar.

Entendo e sei, por experiência própria, que nem sempre é assim que acontece, mas realmente funciona melhor quando essa atitude é verdadeira e quando o pai se esforça e toma para si a tarefa de coeducar o filho do casal, que é o seu filho também, até durante a noite, mesmo atrapalhando seu sono. Isso também faz parte.

A mãe precisa abrir mão desse poder centralizador, por mais que em alguns casos duvide dos talentos do marido em relação aos cuidados com seu filho. Precisa e deve “passar a bola” ao companheiro que terá sua chance e ao seu modo se aventure livremente nessa tarefa de cuidar da criança, afinal quem além da mãe seria a pessoa mais adequada do que o próprio pai para aquietar a criança? Diferente no manejo, menos participativo no cotidiano, inexperiente e talvez até inábil, mas adequadíssimo para a função de cuidar do filho. Com treino e persistência mesmo os mais desajeitados dos pais aprendem as tarefas mais simples e assumem junto com as mães os cuidados com seus filhos. Essa função é do casal, não se pode transferir tampouco adia-la. Criar uma criança precisa de tempo, paciência, dedicação, vontade, coragem também, mas sobretudo amor.

Desse modo, nessa retomada da vida e dos projetos do casal, onde ambos: homem e mulher, tem assegurado o seu próprio desenvolvimento individual e agora também familiar, podem contar um com o outro na criação do seu filho.

A possibilidade de escolher um lugar adequado para a criança ficar enquanto os pais trabalham passa a ser uma tarefa compartilhada. A sensação de abandono, o remorso de deixar a criança pequena na creche, podem também ser divididos pelos pais, que dividem essa escolha e assim se estruturam e repartem a tarefa que decisões desse tipo costumam trazer. Melhor dividir por dois ao invés de apenas um assumir a responsabilidade, tendo em mente que o filho é de ambos. 

Sobre a importância das primeiras experiências que a criança recebe de seus pais, o psicanalista Bruno Bettelheim ensina: “outra indicação de que uma criança ter sido bem criada é sua capacidade de enfrentar razoavelmente as infindáveis vicissitudes, as muitas agruras e as sérias dificuldades que, muito provavelmente, encontrará pela frente e fazer isso sobretudo porque se sente seguro. Embora nem sempre livre de dúvidas sobre si mesmo”.

 

(1) OS BEBÊS E SUAS MÃES / Donald Woods Winnicott – [tradução de Jefferson Luiz Camargo] - São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1988.

(2) UMA VIDA PARA SEU FILHO – Pais bons o bastante / Ajude o seu filho a ser a pessoa que ele deseja – BRUNO BETTELHEIM [tradução de Maura Sardinha e Maria Helena Geordane] – décima oitava edição – Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1989.  



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BRINCADEIRA DE CRIANÇA - artigo



  


A CRIANÇA E SEU BRINCAR

O ser humano só brinca quando é um ser humano no sentido pleno da palavra e é plenamente ser humano quando brinca.                                                                                                                              Schiller.

 

Estimular a criança pequena com brinquedos educativos ajuda em seu desenvolvimento? Essa é uma dúvida comum de muitos pais preocupados com os produtos que chegam às mãos de seus filhos.

A primeira coisa que precisa ficar clara: - O que é um brinquedo educativo? Ou talvez: - Existem brinquedos educativos? Tenho observado que a imensa maioria dos chamados brinquedos “educativos”, são, na verdade, propaganda enganosa, o fato de existir uma recomendação que aquele tipo de brinquedo é aconselhável para crianças de determinada idade, não é garantia suficiente de que seja adequado. A imensa maioria emite algum tipo de som, mesmo muitos daqueles feitos de madeira, com alegada proposta natural, talvez menos excitantes, embora tragam tantos elementos estimulantes que fico procurando como associar a palavra “educativo” em algo tão excitante e antinatural.

Na verdade, a criança gosta de brincar, de descobrir as coisas, crianças pequenas se encantam mais com os embrulhos (e abri-los é uma grande brincadeira para elas) do que propriamente com os seus conteúdos.

 Comento com os pais que os pequenos se divertem mais com o som que fazem com panelas e colheres de pau do que os carrinhos eletrônicos, bonecas falantes ou os monstros e super-heróis que ganham de presente.

Segundo a médica Emmi Pikler (1902 – 1984) comentando a respeito da intervenção dos adultos diante das iniciativas da criança descobrindo as coisas à sua volta: “É crucial que a criança descubra por si mesma tanto quanto possível. Se a ajudamos a finalizar cada tarefa, a estamos privando do mais importante aspecto do seu desenvolvimento. Uma criança que consegue as coisas por meio da experimentação independente adquire um tipo de conhecimento completamente diferente daquela criança para qual são oferecidas soluções prontas”.

Objetos com poucos estímulos artificiais deveriam ser privilegiados. Logicamente que a criança é um excelente consumidor e a indústria e a publicidade voltados para isso já perceberam esse público, nesse caso se justifica investir em um “trambolho” para a criança com especificações técnicas atraentes: possui rodinhas e direção, permitindo sua locomoção, cores vibrantes e ainda dispõe de vários tipos de som. Importante que na etiqueta diz que não tem material tóxico, é recomendada para determinada faixa etária, possui selo e certificação. Isso é suficiente para motivar o pai investir nesse tipo de “brinquedo educativo” que pode até interessar a criança por algum tempo, mas que rapidamente será mais uma peça cara e inútil que ocupará espaço e arrependimento de quem o comprou.  A pergunta anterior a ser feita seria: - Esse tipo de coisa é interessante para a criança, isso realmente vale a pena, qual a vantagem? Exceto a referência narcísica ao dizer: - Meu filho tem aquele brinquedo que buzina, tem rodinhas, parece um foguete, recomendado para sua idade e custou muito caro! Perceber qual a utilidade para a criança desse tipo de aquisição pouparia menos arrependimentos futuros.

Quando a criança começa a descobrir o mundo à sua volta quer explorá-lo e experimentá-lo, então os pais devem observar que a casa que antes era somente de adultos agora comporta também uma pessoa curiosa, que vai querer enfiar o dedo na tomada, que vai pôr a mão no cinzeiro, que vai colocar o dedo no ventilador, então alguns cuidados precisam ser tomados e algumas coisas retiradas de seu alcance. Aquele bibelô lindo de vidro que a mãe comprou quando foi em uma viagem com o marido e que ela adora, deveria ser protegido das mãozinhas velozes dos pequenos exploradores, porque a pergunta que fica é a seguinte: - Caso essa peça se quebre a mãe vai entender ou vai brigar com a criança que nem sabe seu valor? A exploração por esse mundo ainda desconhecido precisa ser observada e não refreada, pois essa autonomia da criança acontece naturalmente e deve ser estimulada.

O mundo da criança agora é a sua casa, então também deve ser verificada com atenção, pois, quando as crianças começam a explorá-la descobrem coisas interessantes e perigosas (tesouras, produtos de limpeza, isqueiros, canetas, objetos de vidro, cortantes ou pontiagudos, comida de cachorro e tudo que ficar próximo de suas mãozinhas rápidas e espertas), nesse caso como gostam de experimentar, levam as coisas à boca e, portanto, convém ficar atentos, evitando acidentes.

Conheço casas onde o lugar da criança brincar e onde ficam seus brinquedos é a própria casa, ou seja: tudo! A criança domina todo o espaço. Nesses casos ela talvez tenha dificuldade de organizar seus brinquedos, que ficam espalhados pela casa toda e, em consequência disso, nem consegue brincar com todos eles e ainda não distingue onde é o seu espaço, porque não tem limite físico para isso. O que adianta o menino ter cinquenta carrinhos se ele não dá conta de brincar com todos eles, a menina que tem um monte de bonecas, nem consegue lembrar o nome de todas. Não seria o caso de evitar oferecer outro carrinho, ou evitar comprar mais uma boneca?

Muitos pais oferecem para a criança aquilo que não tiveram quando pequenos e desse modo tentam compensar alguma falta que sentiram quando pequenos e preenchem essa lacuna através da criança, quando de fato, esses presentes são oferecidos para eles próprios.

Às vezes, como mencionei anteriormente, coisas simples adquirem um significado absolutamente maior que o excesso, nem a sofisticação não preenchem. Assim como também não colabora em nada os aparelhos eletrônicos, os smartphones e os tabletes que as crianças ganham de presente e que começam a fazer parte de suas vidas já desde muito cedo. A pretexto de serem estimulantes ou de oferecer joguinhos e brincadeiras que “toda criança adora”, são placidamente aceitos e fazem parte do mundo infantil substituindo a criatividade por estagnação, não contribuem em nada na descoberta da criança, ao contrário, provocam um reducionismo muito grande, pois trazem elementos excitatórios pelos quais a criança fica literalmente capturada (leia mais no capítulo A criança e o Mundo Virtual).

 É importante se questionar a esse respeito, refletir e ter consciência da introdução desse tipo de “brinquedo” na vida da criança. Quais as vantagens e as desvantagens? Alegar simplesmente que hoje isso é normal pode parecer um argumento muito simplório, ou ficar passivo diante dessa aquisição que foi oferecida pela avó, ou pela madrinha, quando falta a força ou a coragem dos pais para amenizar ou impedir isso, as crianças ficam sem a proteção daqueles que deveriam protege-las.

O grande engano que considero é achar que todos esses elementos: monstros, super-heróis, excesso de brinquedos e jogos eletrônicos são inócuos, acreditando que a manipulação pelas crianças não interfere em nada, que não trará consequências desagradáveis. Pois bem, infelizmente a má notícia é: trazem muitos problemas sim! Mais do que gostaríamos. Porque começam a fazer parte da vida infantil de maneira intensa. O “Homem Aranha”, por exemplo, que a criança ganhou de presente chega até ela com todo o seu repertório e sua imagem fica impressa em sua memória, passa a conviver com ela, às vezes ainda sobra espaço para a fantasia, outras não, justamente porque esses personagens já tem uma história pronta, um enredo e como foram elaborados para outro público, fica no mínimo incongruente que faça parte do universo infantil tão precocemente.

Não podemos deixar de pensar a respeito dessas aquisições e com maturidade decidir o que é adequado para nossas crianças, mais uma vez o crivo deve ser dos pais. Não se pode agir com indiferença porque haverá consequências dessa displicência.

Quando pequenas as crianças descobrem e se encantam com o ambiente à sua volta. Colocando em suas mãos algum brinquedo, equivale a sugestão para que brinque e quanto mais complicada for essa brincadeira, mais dependente de nós ela será. Essa atitude é tão comum nos adultos que talvez isso passe completamente despercebido pela maioria de nós. É intuitivo, porém pouco produtivo no aspecto da autonomia, que façamos as coisas pela criança. Seja pelo pretexto de auxílio ou de participação, geralmente os adultos “atravessam” esse limiar de descoberta que a criança necessita explorar através de seus próprios meios (leia mais no capítulo sobre Autonomia e Independência: Imprescindíveis!).

Nada mais decepcionante do que colocar nas mãozinhas do bebê um chocalho quando, na verdade, o grande prazer é a descoberta de seu próprio corpo. Muitos berços tem tantas “geringonças penduradas” e brinquedos espalhados, que estimulam demais e que alteram até a proposta desse local, que foi feito para descansar e dormir. Outro erro comum, esse com maiores consequências ainda, seria privar a criança de andar sozinha oferecendo andadores para facilitar essa conquista, interferindo não somente no andar, mas ainda na fala e na sequência também em seu pensamento. (1)

Ambientes apropriados para as crianças brincarem não precisam ser repletos de estímulos. Para estimular o potencial criativo podemos oferecer objetos de diferentes formas, tamanhos, cores, volumes, texturas, onde a criança pode explorar de forma curiosa e livremente exercitar sua motricidade, habilidades e autonomia. Quando respeitamos cada etapa do desenvolvimento infantil não impondo regras ou restrições, estamos de fato ajudando-a a ser livre e autossuficiente.

A criança pequena gosta de jogar a bola e recebe-la de volta, com esse gesto simples revela o prazer e a diversão da repetição, estimulando sua autonomia e movimento livre. Quando nos escondemos e de repente surgimos diante dela provocando uma gargalhada gostosa, estamos estimulando a criança a brincadeiras que trazem conforto e alegria que não se compara com o estímulo de bonecos de plástico ou bichinhos de pelúcia.

Crianças pequenas precisam ficar próximas, requerem a observação atenta dos adultos que, não precisam estimulá-las o tempo todo, mas, identificar suas aptidões deixando-as livres para descobrirem seu espaço.

Podemos observar que crianças que rapidamente se entediam de brincarem sozinhas necessitando da presença de um adulto por perto, reforça o sentimento de sua dependência, desse modo suas experimentações ficarão reduzidas àquelas que o adulto irá propor. Não tem curiosidade de explorar novos objetos e seu brincar é monótono, repetitivo e pouco criativo.

 Muitos pais conseguem conciliar suas atividades domésticas e profissionais ao lado de seus pequenos filhos, quando conseguem essa proeza e atendê-los, com paciência e amorosidade, as coisas costumam dar certo, acontece que as crianças também percebem quando esse nível de atenção tem ou não qualidade, ou seja, crianças requerem tempo, dedicação e paciência para não apressar o seu desenvolvimento que é absolutamente individual.

A criança precisa sentir essa disponibilidade do adulto que, antes de qualquer coisa, elege a prioridade de ficar com ela, abrindo mão de alguns afazeres, desse modo a criança vai confiando no adulto que está ao seu lado e aos poucos ganhando autonomia e independência podemos deixa-la mais distante, não significa abandoná-la, estimulando sua independência, então essa segurança vai sendo construída e se fortalecendo cada vez mais.

Geralmente incentivo os pais a cantarem, músicas infantis que ouviam quando eram crianças. São revestidas de afeto, com um sotaque amoroso e acalentador, isso faz toda diferença, a criança brinca ouvindo uma voz humana conhecida e que interage com ela. Os adultos também poderão dispor de algum tempo para lhe dar atenção, observando a atividade em que a criança se encontra envolvida, não fazendo por ela, nem estimulando-a

Desaprendemos a praticar coisas simples, como cantar ou assobiar enquanto estamos realizando nossas tarefas diárias ou não reclamar quando precisamos fazer outras coisas, talvez não tão agradáveis, mas que precisam ser feitas. Não devemos esquecer que as crianças nos observam com atenção e imitam nossos gestos e palavras, portanto, convém ficarmos atentos.

A médica húngara Emmi Pikler comentou a respeito do brincar infantil: “Recentemente tem ocorrido grandes discussões sobre se deixar uma criança brincar demasiadamente de forma livre poderia prejudicar seu desenvolvimento. Nós temos um ponto de vista oposto, o brincar livre, independente, sem ajuda ou incitação de quem a cuida (que no âmbito familiar significa sem a presença dos pais) é fundamental para o desenvolvimento. Porém isso só funciona se proporcionamos continuamente os elementos condutores externos e se a criança está ativa e ocupada, inclusive sem a presença do adulto. É um esforço considerável dar à criança a liberdade e a quietude que requer esse tipo de brincadeira dentro de um grupo de crianças. Pensamos que o esforço vale a pena.” (2)

A infância passa rapidamente e precisamos aproveitá-la da melhor forma possível.

 

 

(1)    ANDAR, FALAR, PENSAR / A ATIVIDADE LÚDICA / Rudolf Steiner [tradução de Jacira Cardoso] – nona edição – São Paulo: Ed. Antroposófica, 2014

(2)    AS ORIGENS DO BRINCAR LIVRE / Éva Kálló/Györgyi Balog – [tradução Susana Martínez] – São Paulo: Omnisciência, 2017. (Coleção primeira infância: educar de 0 a 6 anos)






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ATÉ QUANDO VAI O ALEITAMENTO MATERNO? - artigo







DESMAME, UMA DECISÃO DIFÍCIL DE TOMAR.

É impossível progredir sem mudança e aqueles que não mudam suas mentes não podem nada mudar.

George Bernard Shaw.

 

 Qual a idade certa para desmamar a criança? Essa é uma pergunta que geralmente me fazem e a transfiro para as mães, pois, cabe somente a elas essa resposta, justamente, porque essa decisão passa além do prazer em amamentar o seu filho, não necessariamente pela questão nutricional, mas pelo contato, pelo desejo de adiar um pouco ainda essa interação particular, justamente porque além de prazeroso é bom, único e absolutamente pessoal, esse é um vínculo exclusivo entre a mãe e a criança. Portanto, idade certa é muito relativo. Às vezes esse tempo se prolonga e a substituição por outro tipo de comida, leite artificial ou até sólidos, também é postergada e quem dá essa permissão, quem autoriza essa mudança, inquestionavelmente, é novamente a mãe, mas esse assunto também pode e deveria ser compartilhado, pois é uma escolha que implicará em muitas consequências, nem todas fáceis. 

Alguns bebês rejeitam o seio materno e mesmo com a insistência das mães recusam esse oferecimento e a solução é oferecer leite artificial e utilizam-se as mamadeiras, porém a maioria prefere o leite materno e a introdução de novos alimentos, mesmo de maneira gradativa, também precisa do consentimento materno ou de, pelo menos, de seu incentivo nessa substituição. De uma maneira geral o leite materno preenche todas as necessidades da criança nos primeiros meses de vida, no começo sob uma livre demanda (quando a criança quer o seio é prontamente oferecido), mas logo após os primeiros trinta, quarenta dias esse ritmo já pode ser regulado pela mãe que percebe que existe um tempo biológico regular (por exemplo, de 3 em 3 horas) entre a digestão do leite ingerido e as mamas ficarem novamente cheias de leite, desse modo se estabelece uma sincronia e a mãe começa a voltar gradativamente à sua rotina, porque o bebê incorporou esse horário das mamadas e ela já entende quando o choro anunciado é de fome ou outra coisa. E assim as coisas caminham até os seis, sete meses, com o rodízio dos seios, quinze a vinte minutos em cada seio, a aquisição do sono tranquilo e o desenvolvimento do bebê vai indo muito bem, obrigado; tirando uma cólica ou outra, uma reação pós vacinal, erupção dentária, trata-se de um período tranquilo dentro de casa. Pelo menos é o que a teoria e os manuais de aleitamento materno ensinam e esse processo caminha até os dois anos de idade.

Logicamente que nem sempre é assim, principalmente quando o ritmo das mamadas não acontece e o aleitamento demora muito tempo, a criança não dorme, chora o dia todo, troca o dia pela noite e mãe vira um “zumbi” contentando-se com a hora que o bebê dorme para poder dar um cochilo rápido.

Aparência, leitura além das direcionadas ao bebê, cuidados pessoais, sono tranquilo, outras coisas que saiam desse circuito – mãe-bebê – simplesmente não cabem mais. Quem já não ouviu esse relato de alguma mãe? E o pior, aquelas que passaram por algo semelhante podem acrescentar ainda mais infortúnios, porque depois de certo tempo essa situação aparenta não ter fim, em alguns casos a criança recusa outro tipo de alimento e só fica quieta ao seio materno. O problema parece aumentar quando esse hábito acaba se incorporando na vida da criança que cresce, mas não se desenvolve, seu ritmo de sono fica irregular, o desenvolvimento pondero-estatural fica comprometido e quanto à mãe...bem, essa criatura além de dar conta dessa tarefa tem que se haver com uma série de cobranças: - Interromper a mamada porquê, se o leite materno faz tão bem? – Tirar o leite materno, justo agora que a criança não aceita mais nada?  Quando indecisas, a voz corrente vem em seu auxílio: – Enquanto tiver leite e a criança quiser a mãe deve oferecer! E o receio: - Essa interrupção no aleitamento pode gerar algum trauma no desenvolvimento do meu filho?

Acende um alerta dentro da cabeça da mãe que diz: - Meu filho não pode passar fome! Então elencado a isso surgem várias explicações: “o leite materno faz bem!”; “a criança deve mamar até os dois anos de idade”; “minha mãe me contou que eu mesma mamei até bem tarde”. Difícil remar contra uma maré tão forte.

Essas questões são válidas e completamente pertinentes e sempre que as ouço proferidas por desespero ou por ansiedade materna, tento me colocar no lugar dessas mulheres, que precisam decidir sozinhas esse dilema, às vezes enlouquecedor e terrivelmente solitário.

Evidente que o aleitamento é um maravilhoso ato de amor, um vínculo bastante forte, mas não é a única e absoluta opção. Acredito, justamente por acompanhar essa transição, que essa decisão também pode e deve ser repartida com o pai da criança, porque envolve a família como um todo.

 A criança que mama o seio materno e continua solicitando-o ininterruptamente, sem ritmo e sem horário, nos faz pensar em duas situações: 1. Pouca quantidade de leite materno produzido pela mãe (talvez por exaustão dela própria, que não consegue relaxar e não dá tempo para produzir um volume adequado); 2. O aleitamento é fornecido sem intervalos e funciona como uma espécie de compensação diante das manifestações de desconforto (incômodos nem sempre associados a fome, mas a criança se acostuma e se tranquiliza com o seio na boca).

O problema é que essas situações não se resolvem facilmente, a resolução provisória ganha um propósito e se transforma em definitiva, porque essas atitudes vão sendo incorporadas e a criança aprende que chorando ela consegue mamar, ou rejeitam novas opções alimentares porque sabem que receberam o seio materno, insatisfatório para um adequado suporte calórico-nutricional, enfim esse ciclo se fecha de uma maneira até que satisfatória para a criança, mas muito desfavorável para a mãe e em quase a sua totalidade permanece sozinha, na decisão e durante o processo de desmame. Isso é coisa de mãe! Como dizem alguns e que muitas mães acreditam piamente nisso, como uma espécie de ônus pelo qual elas devem passar, afinal coisas da maternidade, diriam alguns.

Nesse cenário temos dois personagens importantes que se encontram em quase total simbiose: mãe/seio – filho. Enquanto as coisas se ajeitarem e ambos estiverem confortáveis a vida segue seu curso, mas, quando esse arranjo desequilibra por algum motivo, como os citados anteriormente ou outros tantos que surgem na vida familiar, outros personagens deverão ser convocados e o primeiro que se chama é o pai da criança.

Mas onde ele está? Em situações onde a mãe encontra-se sozinha, vai lá que esse apoio não aconteça, deve-se contar com aquilo que se tem e essa tarefa se torna bem mais difícil, mas quando ele está próximo (o que não quer dizer, necessariamente presente), por que não o convidar para participar? Esse é um questionamento importante que precisa ser feito.

Sob o ponto de vista fisiológico o nascimento dos dentes pressupõe e indica que o corpo passa a ter novos elementos, cuja função básica é de receber novos alimentos, começa um processo de transformação no aparelho digestivo que continua começando na boca, agora com o auxílio dos dentes, o PH bucal se modifica, a quantidade de saliva também aumenta e se transforma, conforme a aquisição de novos ingredientes em seu cardápio. A criança pode ser estimulada a mastigar os alimentos ao invés de somente suga-los, o metabolismo se encontra mais amadurecido e a criança pode aceitar perfeitamente outras opções nutritivas, com parcimônia e critério, logicamente. Não significa abolir completamente o leite materno, apenas pensar na possibilidade em que esse não venha a ser o único alimento disponível para a criança se alimentar.

Quando o intervalo entre as mamadas vai ficando cada vez mais curto, avaliar se as necessidades alimentares dessas crianças são preenchidas somente com o leite materno, que embora seja excelente, após algum tempo já não preenche todas as necessidades e deixa de ser exclusivo, sem prejuízo para a criança.

Mostrar à mãe que tem esse tipo de angústia em relação ao desmame, orientando outras possibilidades complementares com introdução de novas opções pode servir de um grande alento e diminuir a ansiedade que muitas mulheres tem em relação ao aleitamento por livre demanda (até quando a criança quiser).

Então, resumidamente, cada caso é um caso. Necessariamente o aleitamento exclusivo até os seis meses não é obrigatoriamente um consenso entre os pediatras e todas as técnicas de amamentação previsíveis não são unanimes, existem as exceções, existem outras possibilidades mais confortáveis às mães que, podem e merecem ter um ritmo de vida mais tranquilo e equilibrado, mesmo continuando a amamentar seu filho, mas não se escravizando a essa única função. Isso tudo tem a ver com o desmame, pois envolve uma subjetividade que se camufla no desejo da mãe de querer o melhor para seu filho e também controla-lo, mas que também quer e precisa dormir, tomar um banho em paz, poder contar com alguém cuidando do filho enquanto faz outra coisa, em razão disso é que, entre outras coisas, oriento a “convocação” paterna. A palavra é exatamente essa, esse chamamento deve ser imperativo por parte da mãe, aqui não se trata de uma concessão, de uma ajuda, de um “quebra-galho”, mas de uma participação efetiva, de um compromisso, com a prioridade do momento de vida do casal, ou seja, compartilhar os cuidados com o filho deles.

Muitos pais (infelizmente) acreditam que essa empreitada é feminina e nessa espécie de desinteresse velado, podem se justificar dizendo: - Não sei o que fazer quando o bebê chora! – Não tenho leite de peito! - Quando começa a chorar só fica quieto quando está mamando no peito da mãe! O que pode até explicar o comodismo, mas não colabora com a transformação necessária para esse nó desenrolar.

De outro modo cabe também esclarecer que existe um grande movimento em torno do estímulo ao aleitamento materno o qual, de modo algum merece qualquer contestação, a questão que fica é em torno do oferecimento, ou seja, qual o ritmo dessas mamadas? Livre demanda?  Nesse caso o bebê (e até as crianças acima de dois anos), é que terão o domínio da refeição? Com o risco de que desse modo nem sempre, se observa um resultado satisfatório, seja do ponto de vista nutricional (com a monotonia alimentar e a quase que exclusividade pelo leite materno) e também em seu desenvolvimento psíquico, porque a autonomia saudável fica substituída por uma simbiose muito intensa e, caso venha a se tornar um hábito, sua interrupção adiada será muito brusca com prejuízos para a dupla mãe e filho.

O desmame, assim como outros processos de ruptura não são fáceis, quando pensamos no desenvolvimento infantil esse será apenas um deles. Outros percalços já aconteceram anteriormente: quando o bebê nasceu e saiu da barriga da mãe com todas as suas consequências, assaduras, cólicas, erupção dos dentes, etc. Daqui para frente outros cortes também deverão acontecer: a retirada das fraldas, a autonomia de andar sozinho, dormir em seu próprio quarto, introdução de sólidos, o controle dos esfíncteres e, finalmente o momento da criança sair de casa e ir para outro ambiente, geralmente a escola, onde passará uma boa parte de sua vida.

Cortes precisam ser feitos, o desmame, a retirada do seio materno é uma decisão difícil e cuidadosa, mas não pode ser adiada além da conta, um dia tem que parar, quando a mãe decide isso esse desmame acontece, com apoio e menos cobrança fica mais fácil.



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ISOLAMENTO SOCIAL, INTROVERSÃO OU TIMIDEZ - A CRIANÇA SOLITÁRIA - artigo










MEU FILHO NÃO TEM AMIGOS.

 

ECO, responda bem certo.

Meus amigos me amarão?

E o ECO me responde: sim!

Mário de Andrade.

 

Amizade é um amor que nunca morre.

Rubem Alves.

 

Meu filho não brinca com outras crianças! Minha filha não brinca com as coleguinhas e quando insistimos ela chora e diz que não quer ir mais na escola! Fica muito tempo sozinho e não chama ninguém para brincar, quando “forçamos” ele chora e quer ir para casa! Relatos comuns e os pais não sabem como agir.

E se perguntam: - Seria timidez ou algo mais sério? - Filhos únicos tem maior dificuldade de entrosamento do que crianças que tem mais irmãos? - Temperamentos mais introvertidos preferem ficar sós? – O que eu posso fazer para ele mudar?

Pais e professores que lidam com crianças introvertidas que preferem o isolamento ficam preocupados com esse tipo de atitude e querem ajuda-las a serem mais sociáveis e extrovertidas.

Cada vez mais os núcleos familiares se encontram diminuídos. Muitos casais tem um ou dois filhos. Nos grandes centros as famílias se isolam em apartamentos ou condomínios. O contato com os primos e primas, vizinhos que frequentam áreas comuns são cada vez mais raros. Às vezes esses encontros acontecem, mas, sendo muito esporádico, falta intimidade, essa ausência de proximidade não ajuda muito no manejo necessário dos relacionamentos. Para que isso aconteça naturalmente também precisa de treino, de repetição.

Por sua vez, pais tímidos costumam defender a quietude de seus filhos e não se importam tanto com o isolamento deles, pois se identificam com essa característica, recordam como eram quando crianças, sendo muitas vezes incompreendidos e se solidarizam. Por outro lado, aqueles mais expansivos não admitem que seus filhos, ao contrário deles mesmos, prefiram permanecer sozinhos ao invés da companhia de outras pessoas e fazem tudo o que podem para que as crianças se modifiquem, interajam mais e sejam mais sociáveis. Classificam como um grave defeito o fato da criança preferir ficar só.

Antes de classificar a criança quieta como sendo portadora de algum sério distúrbio comportamental convém observá-la com cuidado. Como ela se comporta em ambientes desconhecidos: observa e depois consegue interagir ou permanece na defensiva durante todo o tempo? Na escola, por exemplo, demorou muito para fazer a adaptação, interage somente com os adultos, principalmente com a professora? Chora o tempo todo? Tem muita dificuldade em lidar com os limites? Não brinca com nenhuma criança ou agride (algumas mordem) quando são confrontadas?

Essas considerações importam quando, honestamente podemos observar a criança, e procurar entende-la antes de julgá-la e classifica-la. A criança pode ser apenas diferente daquilo que esperaríamos que fosse. Simplesmente carimba-la de insociável, introvertida, tímida ou muito quieta não parece ajudar muito. Embora o isolamento social seja algo a ser considerado, vale também considerar outras opções.

Carl Jung (1875 – 1961) em seu livro, Tipos Psicológicos, refere que: “introvertidas são atraídas pelo mundo interior do pensamento, extrovertidos pela vida externa de pessoas e atividades; introvertidos focam no significado que tiram dos eventos ao seu redor; extrovertidos mergulham nos próprios acontecimentos”. Atualmente, introversão e extroversão são dois dos aspectos mais pesquisados na psicologia da personalidade.

A sociedade diz que para sermos bem-sucedidos temos de ser ousados e nos posicionarmos; que para sermos felizes, temos de ser sociáveis. Almejamos ser uma nação de extrovertidos, sorridentes e sociáveis e talvez isso possa significar que perdemos de vista aquilo que realmente somos. Como os quietos e os introvertidos poderão viver nesse mundo falante e expansivo?

A escritora Susan Horowitz Cain, descreve os percalços em educar crianças quietas em um mundo que não consegue ouvi-las: “Uma das melhores coisas que se você pode fazer por uma criança introvertida é trabalhar com ela em suas reações a novidades. Lembrem-se que introvertidos não reagem apenas a novas pessoas, mas também a novos lugares e acontecimentos. Então não confunda a reserva de seu filho diante de situações novas com incapacidade de se relacionar com os outros. Ele está recuando diante da novidade ou da superestimulação, não diante do contato humano.” (*).

Portanto, nem sempre os quietos e reservados devem ser rotulados como “esquisitos”, talvez sejam introvertidos e precisem de ajuda para participarem no mundo onde a cobrança por desempenho e extroversão são um passaporte social mais aceitável e acessível.

Também vale lembrar que pessoas introvertidas não são necessariamente tímidas. Timidez é o medo da desaprovação social e da humilhação inserida nessa premissa, enquanto a introversão é a preferência por ambientes que não sejam estimulantes demais. A timidez pode ser inerentemente dolorosa, a introversão, não.

O sociólogo e filósofo Zygmunt Bauman (1925 – 2017), que desenvolveu uma teoria para explicar o modo de vida na sociedade contemporânea dizia que: “hoje, o medo da exposição foi abafado pela alegria de ser notado”. Portanto, vivendo em “tempos líquidos”, como ele também classifica nossa época, aqueles que preferem não serem notados, simplesmente não aparecem.

Os pais podem promover alguns encontros com seus filhos, desde que não o exponham demais. De preferência em sua própria casa, pois é um espaço conhecido onde a criança se sentirá mais segura. Nesse encontro também deverá ter alguns ajustes: a criança precisa concordar em receber o amigo em casa e muitas vezes será mais curto do que o previsto; dependendo da companhia, crianças mais reservadas não interagem inicialmente com aquelas mais efusivas, talvez dois quietos consigam “falar a mesma língua”; não adianta promover esses encontros e deixar que as crianças fiquem na frente da televisão; atividades ao ar livre ou mesmo jogos e brincadeiras não competitivas podem ajudar a que as crianças experimentem sair de seus casulos. O importante é que a criança perceba que ela pode ser diferente, ficar quieta, preferir brincar sozinha e tudo estará certo. Se os adultos conduzirem de forma cuidadosa e sem ansiedade ela possa encontrar o seu próprio jeito de se expressar. Como é difícil para os introvertidos avaliarem os seus próprios talentos e o quanto é magnífico e significativo quando finalmente conseguem.

          Existe um ensinamento búdico que ensina que: “Nossa vida é nossa oportunidade”. Como pais e condutores percebemos que as crianças, às vezes, são muito parecidas conosco, o que pode ser bom ou talvez temerário, principalmente se temos dificuldade em nos aceitar como somos. Justamente nessa constatação temos a oportunidade de mudar. Aqueles que sofreram em sua vida sendo taxados de tímidos e sem expressão, ficam compadecidos quando identificam esse padrão em seu filho e podem ajuda-lo, não querendo modifica-lo, mas podendo dizer que o entende, porque já passou por isso também e esse pertencimento e aceitação faz toda a diferença. Por outro lado, alguns identificam em seus filhos exatamente o contrário do que consideram satisfatório e, mesmo sem querer, os rejeitam por não corresponderem às suas expectativas, às vezes, se trata de uma “má combinação entre pais e filho” e para que isso se transforme é importante que os pais aceitem e ajudem os filhos que tem. Experimentando uma recombinação.

          Fernando Pessoa nos propõe algo simples e profundo ao dizer que: “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”

 

 

(*) O PODER DOS QUIETOS – Como os tímidos e introvertidos podem mudar um mundo que não para de falar – Susan Cain – [tradução de Ana Carolina Bento Ribeiro] – Rio de Janeiro: Agir, 2012 – pag. 248.

 


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